Conferências Ambientais


A Conferência de Estocolmo em 1972
No final dos anos 60, os países industrializados estavam começando a perceber o impacto negativo das suas tecnologias: lagos e rios poluídos, florestas sendo destruídas pela chuva ácida, poluição do ar nas grandes cidades. A população afetada por esses problemas começou a se organizar em grupos de protesto, que exigiam o controle da poluição, a conservação e a proteção da natureza. A atuação das ONGs, o aumento da conscientização sobre os problemas ambientais e as reclamações da Suécia, que estava sofrendo as conseqüências da chuva ácida proveniente das emissôes da Inglaterra e da Alemanha, contribuíram decisivamente para que as Nações Unidas decidissem em 1968, durante sua Assembléia Geral, convocar a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano. Essa Conferência foi realizada entre 5 e 16 de junho de 1972, em Estocolmo, na Suécia.
Clube de Roma
Um grupo de cientistas que teve grande influência nessa época foi o Clube de Roma, criado em 1968, na Academia dei Lincei – a Academia de Leonardo da Vinci –, em Roma.  Cientistas de vários países o integravam, com a intenção precípua de estudar e propor soluções para os complexos problemas decorrentes da crescente pressão que a explosão demográfica já exercia sobre o delicado equilíbrio dos ecossistemas do planeta e sobre os recursos não-renováveis.  A atuação do Clube pode ser analisada em duas fases distintas: a fase ecológica e a social.
A primeira fase foi dominada pela preocupação com o equilíbrio ecológico e com o esgotamento dos recursos não-renováveis do planeta, acompanhando a crescente conscientização em torno da questão, especialmente nos países já desenvolvidos.  Em 1971, diversos cientistas, liderados por D. Meadows, submeteram ao Clube de Roma o Primeiro Relatório, denominado Os Limites do Crescimento– The Limits to Growth –, baseado num complexo modelo matemático mundial, que utilizava a nova metodologia de dinâmica de sistemas – system dynamics.  Esse relatório mostrava que se continuassem, a longo prazo, as mesmas taxas de crescimento demográfico, industrialização e utilização de recursos naturais, inevitáveis efeitos catastróficos ocorreriam em meados do próximo século – fome, escassez de recursos naturais, altos níveis de poluição –, com a redução da produção industrial e de alimentos, e culminariam com uma incontrolável mortandade da população .
O modelo matemático foi usado para analisar vários cenários possíveis para o futuro da humanidade. A figura anterior mostra o resultado do cenário 1, denominado padrão do modelo mundial, que usou os valores históricos de 1900 a 1970 e supôs que não houvesse alterações importantes nas relações físicas, econômicas ou sociais a partir de 1970 – business as usual. Produção de alimentos e produção industrial crescem exponencialmente até que a rápida diminuição de recursos naturais – e a escassez de alguns recursos estratégicos – force a diminuição da produção industrial e a de alimentos. Algum tempo depois ocorre uma incontrolável mortandade e redução da população.
Vários outros cenários foram analisados: modelo mundial com reservas duplicadas – a poluição iria se tornar um grande problema –, reservas ilimitadas e controle da poluição – o problema seria o limite de terras cultiváveis para a produção de alimentos –; e com reservas ilimitadas, controle da poluição e aumento da produtividade agrícola. Em todas as alternativas, antes do ano 2100 aconteceria a mortandade incontrolável e a redução da população. Um único cenário, o modelo mundial estabilizado, evitava o desastre: as alternativas adotadas incluíam a reciclagem dos recursos naturais, dispositivos de controle da poluição e do crescimento populacional, métodos de restauração dos solos destruídos pela erosão, maior ênfase na alimentação e nos serviços do que na produção industrial.
Portanto, para evitar a catástrofe anunciada, o Relatório Limites do Crescimento recomendava a imediata adoção de uma política mundial de contenção do crescimento, visando atingir um estado de equilíbrio o mais cedo possível. Embora o relatório afirmasse que esse estado de equilíbrio global poderia ser planejado de forma que todas as pessoas tivessem suas necessidades básicas atendidas e oportunidades iguais de realizar seu potencial humano, os países subdesenvolvidos entenderam que essa política, denominada crescimento zero, se adotada, condenaria a maioria dos países da Terra a situações de permanente subdesenvolvimento.
Como era de se esperar, essa proposta foi imediatamente contestada e críticas surgiram quanto à validade das conclusões apresentadas e dos resultados obtidos através das simulações pelo modelo matemático. Esse modelo abrigava algumas simplificações extremas, como, por exemplo, a de se considerar o mundo como homogêneo em relação ao consumo de energia e de matérias-primas.  Além disso, a maior parte das inter-relações usadas no modelo era arbitrária, sem justificativa científica.  Os países subdesenvolvidos não aceitaram os resultados do modelo, nem tampouco a proposta de crescimento zero.
Em 1972, Hugo Scolnik, da Universidade Cândido Mendes, fez uma análise de sensibilidade na versão original do World 3 – modelo no qual se baseou o Limites do Crescimento – e mostrou que, além do modelo ser altamente instável, havia políticas para evitar a catástrofe, sem condenar os países do terceiro mundo ao subdesenvolvimento eterno.
Conferência de Estocolmo
A divulgação do Relatório Limites do Crescimento, em 1971, influenciou decisivamente o teor das discussões na Conferência de Estocolmo.  Algumas reuniões preparatórias foram realizadas, como a reunião especial do Painel de Especialistas em Desenvolvimento e Meio Ambiente, em Founex, Suíça, em junho de 1971. O Painel de Founeax facilitou os acordos que seriam fechados em Estocolmo no ano seguinte, por enfatizar que meio ambiente e desenvolvimento eram os dois lados da mesma moeda, e que o meio ambiente era um problema relacionado não somente com os aspectos biofísicos mas também com os aspectos sócio-econômicos. Das discussões da Reunião de Founex surgiu o conceito de ecodesenvolvimento, que previa um desenvolvimento baseado na potencialidade de cada ecossistema, levando em conta a participação das populações locais, a redução dos desperdícios de qualquer ordem e a reciclagem dos resíduos.
Apesar disso, a maioria dos países subdesenvolvidos, incluindo o Brasil, encarou essa Conferência das Nações Unidas como uma tentativa de frear o seu desenvolvimento, através do controle da poluição industrial.  Nas reuniões preparatórias e durante a conferência, representantes dos países industrializados diziam para os dos países em desenvolvimento: Vejam a situação em que nos encontramos, com poluição do ar e das águas em nossos países e cidades. Não queiram repetir os nossos erros.
A Conferência de Estocolmo foi iniciada no dia 5 de junho de 1972, dia que desde então é comemorado como o Dia Mundial do Meio Ambiente. Estiveram representados 113 países.
Aceitar a proposta do crescimento zero significava condenar os países em desenvolvimento ao subdesenvolvimento eterno, pois estava implicito que os países não deveriam aumentar os seus consumos per capita  de energia e recursos naturais. Críticas surgiram quanto à validade das conclusões apresentadas e dos resultados obtidos através das simulações pelo modelo matemático. Esse modelo abrigava algumas simplificações extremas como, por exemplo, a de considerar o mundo como homogêneo em relação ao consumo de energia e de matérias- primas, não fazer distinção entre população rural e urbana, e não considerar aspectos relacionados à saúde. 
A reação dos países em desenvolvimento foi liderada pelo Brasil e pela Índia. A Primeira Ministra da Índia, Indira Gandhi, único Chefe de Estado presente na conferência, durante seu discurso cunhou uma frase que se tornaria famosa: O pior tipo de poluição é a pobreza, a falta de condições mínimas de alimentação, saneamento e educação.
Como resultados concretos da conferência, foi aprovada a Declaração de Estocolmo, que passou a ser a Bíblia dos ambientalistas, e a proposta para que as Nações Unidas criassem um programa específico para o meio ambiente. A Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente, aprovada ao final da conferência, exigiu grande habilidade diplomática para obter o consenso entre os países desenvolvidos e subdesenvolvidos, e afirma que: Nos países em desenvolvimento a maioria dos problemas ambientais é motivada pelo subdesenvolvimento. No seu Princípio nº 1, expressa a convicção de que: O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e a adequadas condições de vida em ambiente que lhe permita viver com dignidade e bem-estar, e tem a solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações atuais e futuras.
Durante a Assembléia Geral das Nações Unidas de 1972, foi aprovada a proposta para a criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente - PNUMA, e sua sede mundial, instalada em Nairobi, Quênia. O PNUMA foi criado com o objetivo de catalisar e coordenar as atividades de proteção ambiental dentro do sistema das Nações Unidas e entre os vários organismos de âmbito regional e internacional, além de entidades governamentais.  Foi criado também um Fundo Voluntário para o Meio Ambiente gerido pelo PNUMA, e o dia 5 de junho passou a ser celebrado como o Dia Mundial do Meio Ambiente.
A partir de 1972, o movimento ambientalista cresceu muito, em alguns países chegando a formar os partidos verdes, como na Alemanha. As questões ambientais passaram a fazer parte dos temas globais, juntamente com a proteção dos Direitos Humanos, as questões relacionadas com o crescimento populacional e com as migrações, e o controle das armas de destruição em massa.
O segundo relatório do Clube de Roma
Em 1973, um grupo de cientistas liderado por Mesarovic e Pestel apresentou o Segundo Relatório do Clube de Roma, denominado Momento de Decisão – Mankind at the Turning Point –, no qual tentaram corrigir as distorções do primeiro modelo.  Subdividiram o planeta em 10 regiões homogêneas – em relação ao consumo de materiais e energia – e foram propostos vários cenários alternativos que analisavam, inclusive, os efeitos do retardamento da tomada de decisões.  Esse modelo, embora mais flexível que o World 3, pois permitia que o usuário explorasse mais facilmente alternativas diferentes, ainda apresentava muitos problemas. Entre eles, o enfoque dado ao crescimento demográfico, sem base científica, e o fato de não haver relação entre necessidade e produção de alimentos, mesmo quando o déficit produzia efeitos catastróficos. Assim como no modelo anterior, não havia distinção entre as populações rural e urbana, e não foram considerados os aspectos de saúde e de habitação.  A poluição, com um papel central no modelo anterior, aqui, praticamente, não foi considerada.  O fator mais importante nesse novo modelo foi a energia, em virtude da crise mundial provocada pelo aumento dos preços do petróleo.
Os resultados não divergiram substancialmente dos do primeiro relatório; além disso, indicavam também um grande declínio da população mundial a partir do ano 2025 e mostravam claramente que as crises mais prováveis, como a fome, tenderiam a se manifestar primeiramente na Ásia.  O relatório afirmava, em conclusão: Os homens não podem mais esperar que as mudanças se produzam espontaneamente e por acaso. Cabe-lhes tomar a iniciativa das transformações necessárias, a fim de que elas permaneçam nos limites suportáveis e que não sejam impostas maciça e brutalmente, a partir do exterior.  Em vez do crescimento zero do modelo anterior, propunham, para evitar a catástrofe, a elaboração de uma estratégia cooperativa para todos os países, orientada por um plano global, que chamaram Crescimento Orgânico.
O terceiro relatório do Clube de Roma
Participaram da elaboração dos dois primeiros relatórios do Clube de Roma apenas cientistas das chamadas ciências exatas: matemáticos, físicos, químicos, biólogos e outros. Para a elaboração de seu terceiro relatório, o Clube de Roma resolveu convidar também cientistas das ciências sociais, como economistas e sociólogos. O holandês Jan Timbergen, Prêmio Nobel de Economia, foi chamado para coordenar a equipe e iniciou um estudo que incluía o problema dos desequilíbrios entre os países desenvolvidos – quase todos no hemisfério norte – e os subdesenvolvidos – predominantemente no hemisfério sul.  Esse terceiro relatório foi apresentado ao Clube de Roma em 1976, na Argélia, com o nome de Para uma Nova Ordem Internacional – Reshaping the International Order. O relatório mostrava que a relação média de renda dos países desenvolvidos em relação aos subdesenvolvidos, naquela época, era de 13/1, considerada inaceitável, em virtude dos problemas que já estava provocando – incluindo a migração clandestina para os países industrializados – e dos que poderia  provocar no futuro próximo, pois a tendência era essa relação continuar a crescer.
O estudo concluía que, antes de serem atingidos os limites físicos do nosso planeta – pelo crescimento populacional, esgotamento dos recursos naturais e poluição –, ocorreriam grandes convulsões sociais, econômicas e políticas provocadas por esse enorme desnível entre os países.  Para que essa diferença pudesse ser reduzida em cerca de quatro décadas para 13/4 – ou aproximadamente 3/1 –, que representava então a diferença de nível entre as regiões mais ricas e pobres da Europa Ocidental e, portanto, bem mais aceitável, seria necessário:
• um esforço sustentado de crescimento dos países subdesenvolvidos – 5% de crescimento per capita – contra um mais moderado – 1,7% – dos desenvolvidos;
•um crescimento demográfico 0,1% inferior à previsão mais baixa das Nações Unidas;
•um crescimento da oferta de alimentos de 3,15% ao ano – contra 2,7% da época.
O conjunto de medidas proposto por Timbergen, no propósito de lograr as metas mínimas que considerava aceitáveis para uma sociedade mundial mais eqüitativa, configurava uma Nova Ordem Econômica Mundial e conduzia a taxas diferenciais de crescimento per capita que favoreciam o Terceiro Mundo, apoiadas em:
•novas facilidades para o comércio de matérias-primas dos países subdesenvolvidos;
•maciças transferências de capital e de tecnologia;
•maior produtividade agrícola;
•várias medidas de caráter assistencial;
•consenso geral dos principais países dos dois hemisférios;
•redução dos gastos em armamentos – possível com o reforço da autoridade das Nações Unidas ;
•criação do equivalente a um imposto de renda internacional para efetuarem-se transferências líquidas para o Terceiro Mundo.
A simples análise dessa proposta nos leva a entender porque a distância entre os países desenvolvidos e subdesenvolvidos continuou a aumentar. Na realidade algumas dessas medidas foram implantadas, só que exatamente ao contrário.
1- Em vez de novas facilidades para o comércio de matérias-primas, os países subdesenvolvidos enfrentam um protecionismo cada vez maior adotado pelos países desenvolvidos, através de barreiras e subsídios.
2- Ao contrário de maciças transferências de capital para os países subdesenvolvidos, esses países passaram, a partir dos anos 80, a ser fornecedores líquidos de capital para os países desenvolvidos, em virtude da enorme dívida externa acumulada – o preço das matérias-primas exportadas pelos países do Terceiro Mundo atingiu nos anos 90 valores tão baixos quanto os da época da grande recessão de 1929.
3- A tecnologia tornou-se o mais importante dos fatores de produção – capital, matéria-prima, mão-de-obra e tecnologia. O país que possui tecnologia de ponta praticamente não depende mais dos outros fatores – exemplo do Japão.  Tecnologia, portanto, significa poder – e tem custo para ser desenvolvida – e, por isso mesmo, nunca foi transferida de graça para os países subdesenvolvidos.
4- O final dos anos 70 e o início dos anos 80 foram marcados por um grande aumento nos gastos militares mundiais, que atingiram em 1985 a cifra de US$ 1 trilhão por ano – quase 10 vezes maior que os gastos militares de 1960.   

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