O Acordo de Paris e os desafios para o Brasil
As negociações sobre mudanças
climáticas início se sexta-feira, dia 4 de novembro 2016, com a entrada em
vigor do Acordo de Paris. Ao tornar-se lei internacional, o Acordo de Paris
representará o mais novo e esperançoso instrumento da comunidade global em
reduzir as emissões de gases de efeito estufa, de modo que a temperatura do
planeta não suba mais do que 2 graus Celsius até o fim do século 21, com
indicação de que os esforços sejam para um limite de 1,5 C em relação aos
níveis pré-industrias. O Acordo representa, entretanto, importantes desafios
para a comunidade internacional e também para o Brasil. O Observatório do
Clima, manifesta grande preocupação com movimentos na base aliada do governo
atuante no período.
O secretário executivo do
Observatório do Clima, Carlos Rittl, nota que todos os países signatários da
Convenção sobre Mudanças Climáticas das ONU se comprometeram com o limite de
1,5 C. “Cabe a todos, então, adotar compromissos nacionais compatíveis com este
objetivo para que o Acordo seja efetivo”, ressalta o especialista.
“O que ocorre agora é que as
promessas de cada país, feitas antes da aprovação do Acordo de Paris no ano
passado, quando somadas, nos levam, no melhor dos cenários a um aquecimento
global em torno de 3 graus Celsius”, adverte Carlos Rittl. Na sua opinião é
preciso, então, aumentar a ambição, ou seja, que todos, e em especial os grandes
emissores de gases de efeito estufa, o que inclui o Brasil, “se comprometam com
cortes mais profundos e mais rápidos de suas emissões desde já e que sempre que
assumirem novas metas climáticas, que estas sejam melhores que as anteriores, e
que sigam a orientação da ciência para que coloquem as emissões globais na
trajetória ótima para os limites propostos”.
De fato, são vários estudos, de
importantes organizações, apontando que as metas apresentadas pelo conjunto de
países, antes de ser firmado o Acordo de Paris, não garantiam a redução da
emissão de gases, para que a temperatura suba no máximo 2C até o final do
século. Como informou a Agência Social de Notícias (aqui), o próprio
Secretariado da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas divulgou
no dia 30 de outubro do ano passado, poucas semanas antes da aprovação do
Acordo de Paris, um relatório inquietante, indicando – ou admitindo – que as
metas e ações apontadas pelo conjunto de países que participariam da
Conferência do Clima (COP-21) na capital francesa seriam insuficientes para se
atingir aquela meta.
O Secretariado estimava que os
esforços projetados fariam com que a temperatura atinja cerca de 2,7 graus até
o final do século, o que representaria grandes impactos, como maiores secas em
algumas regiões e chuvas intensas em outras, maior derretimento de geleiras e
elevação do nível dos oceanos.
O cenário no Brasil – Muito a que caminhar, do mesmo modo, no caso
brasileiro, na avaliação do Observatório do Clima. O secretário-executivo Carlos
Rittl entende que as metas brasileiras, apresentadas no marco do Acordo de
Paris, “são melhores do que a de todos os grandes países em desenvolvimento,
uma vez que o Brasil foi o único grande país em desenvolvimento a adotar meta
de redução absoluta de emissões”. As metas anunciadas pelo então governo de
Dilma Rousseff, e reafirmadas pelo governo de Michel Temer, são de corte de 37%
de emissões em 2025 em relação aos níveis de 2005 e uma intenção de corte de
43% em 2030, em relação aos mesmos níveis de 2005.
China e Índia, por exemplo,
destaca Rittl, disseram que vão reduzir a intensidade de carbono de suas
economias – emissões por unidade de PIB, enquanto outros, como o México,
disseram que vão reduzir emissões em relação a uma projeção futura de emissões
na ausência de ações para sua redução.
Entretanto, ainda que melhores
que as de outros países, as metas brasileiras “não são suficientes para dizer
que o Brasil terá feito sua parte para ficarmos dentro dos limites de
aquecimento global acordados em Paris”, diz o especialista. “Vamos ter que
revisar nossas metas antes de 2020, assim como todos os grandes emissores, para
chegarmos a metas adequadas”, acrescenta.
Além disso, acentua Rittl, nas
ações propostas para reduzir emissões, há problemas. “Uma delas é a eliminação
do desmatamento ilegal na Amazônia em 2030. Isso significa que o Brasil se
comprometeu com a tolerância com o crime florestal até 2030 na Amazônia e sem
prazo para outras regiões. A taxa anual de desmatamento na Amazônia aumentou no
ano passado e deve, infelizmente, aumentar de novo neste ano. Temos que mudar
este cenário e começar a falar sério sobre desmatamento zero, restringindo a
expansão da agropecuária a área estimada entre 500 mil e 900 mil km2 de
pastagens abandonadas ou pouco produtivas”, explica.
Até o momento, lamenta o
secretário-executivo do Observatório do Clima, a questão climática “vem sendo
tratada como tema estratégico apenas no discurso de dois Ministros, o de
Relações Exteriores, José Serra, e principalmente o de Meio Ambiente, José
Sarney Filho”. O presidente Temer, por sua vez, “limitou-se a tratar do tema em
poucos momentos, como na Cerimônia de Ratificação, realizada no Palácio do
Planalto, e tratando o assunto como da pauta ambiental, e não como tema
estratégico da nossa agenda de desenvolvimento, como de fato o é”, lembra
Rittl.
E, mais inquietante, frisa, “há
vários sinais dados pela base de apoio do Governo no Congresso, como a
tentativa de desmantelar o licenciamento ambiental (o que poderia criar uma
fábrica de desastres, como o de Mariana), as propostas para transferir para o
Congresso o poder de decidir pela demarcação de Terras Indígenas e criar áreas
protegidas, além de propostas que visam dar sobrevida às termelétricas a carvão
mineral (que polui o ar e os rios, consome muita água e aquece o planeta) no
pós-2020 e a insistência em ampliar os investimentos em infraestrutura para
processar todo petróleo e o gás do no pré-sal”.
Se o mundo consumir todas as
reservas conhecidas de combustíveis fósseis, adverte Rittl, o planeta chegaria
a um aquecimento global em torno de 8 graus Celsius. “O governo Temer precisa,
portanto, mostrar à sociedade brasileira e ao mundo se a ratificação do Acordo
de Paris foi de fato um compromisso sério, ou apenas uma foto-oportunidade
política, que não tem eco nas decisões sobre nossas políticas e investimentos
para nosso desenvolvimento”, conclui o porta-voz do Observatório do Clima,
deixando claro que há necessidade de correção de rotas e o risco de se optar
por alternativas que vão na direção contrária das propaladas metas ambiciosas
do Brasil em corte de emissões.
O Observatório do Clima é uma
rede que reúne entidades da sociedade civil com o objetivo de discutir a
questão das mudanças climáticas no contexto brasileiro. O OC promove encontros
com especialistas na área, além de articular os atores sociais para que o
governo brasileiro assuma compromissos e crie políticas públicas efetivas em
favor da mitigação e da adaptação do Brasil em relação à mudança do clima. Entre
outras organizações, integram o Observatório do Clima: Amigos da Terra Amazônia
Brasileira, Fundação Grupo Boticário, Greenpeace, Instituto de Energia e Meio
Ambiente, Imazon, Instituto Socioambiental (ISA), SOS Mata Atlântica e WWF
Brasil.
Fonte: José Pedro Martins – Agencia ASN
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