Desperdício de Alimentos
Brasil desperdiça 40 mil
toneladas de alimento por dia, e brasileiros precisam mudar seus hábitos, para
reduzir desperdício.
No Brasil, diariamente, são
desperdiçados 40 mil toneladas de alimentos, segundo Viviane Romeiro,
coordenadora de Mudanças Climáticas do World Resources Institute (WRI) Brasil,
uma instituição de pesquisa internacional. Isso coloca o Brasil, segundo ela, entre
os dez países que mais perdem e desperdiçam alimentos no mundo. Viviane
participou do Sustainable Food Summit da América Latina, evento promovido pela
Rede Save Food Brasil, na tarde de quinta-feira (30 junho 2016), em São Paulo,
e que discutiu a perda e o desperdício com alimentos em todo o mundo.
“O Brasil está entre os dez
principais países que mais perdem e desperdiçam alimento. Estamos falando da
cadeia de perda e de desperdício. Perda que tem a ver com a colheita, a
pós-colheita, com a distribuição e o desperdício que já vem no final da cadeia,
que é no varejo, no supermercado e com o hábito do consumidor”, disse Viviane.
Essa perda e desperdício de
alimentos tem diversas implicações. Uma delas é com relação à segurança
alimentar. “Hoje temos aproximadamente 7 bilhões de pessoas [no mundo] e a
estimativa é que, em 2050, seremos 9 bilhões. Enquanto isso, aproximadamente 1
bilhão de pessoas não tem acesso adequado e sofre com desnutrição e falta de
alimento adequado. Então, primeiramente, essa é uma questão de segurança
alimentar”, disse.
Segundo Allan Boujanic,
representante da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação
(FAO) no Brasil, cerca de 30% de tudo o que é produzido no mundo é desperdiçado
e perdido antes de chegar à mesa do consumidor. Isso provoca, segundo a FAO, um
prejuízo econômico estimado em US$ 940 bilhões por ano, o que corresponde a
cerca de R$ 3 trilhões.
Problemas ambientais – Outras implicações, segundo Viviane, dizem
respeito aos aspectos econômico e ambiental. “É um assunto que envolve uma
questão social e de segurança alimentar, de impacto econômico, mas também de
impactos ambientais e aí destacamos essencialmente a perda da biodiversidade,
impactos na biodiversidade, impactos no uso do solo, na questão da água, da
escassez da água, e também a questão do clima, das emissões de carbono”, disse.
Sobre a questão ambiental,
Viviane disse que, se essa perda mundial com os alimentos fosse um país, ela
seria o terceiro maior país do mundo por emissão de gás de efeito estufa, por
exemplo, ficando atrás apenas da China e dos Estados Unidos.
Rede Save Food – Para buscar alternativas para reduzir a perda e o
desperdício de alimentos no país foi criada a rede Save Food Brasil, que tem
apoio da FAO, da WRI e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(Embrapa), entre outros. “Essa e outras campanhas da FAO para combater o
desperdício de alimentos têm como principal mensagem a mudança de atitude.
Temos que ser mais eficientes no uso dos alimentos, mais cientes de que o desperdício
é uma realidade e produz muitos efeitos colaterais. É necessário um forte
engajamento da sociedade civil, dos produtores e dos governos para fixar metas
concretas de redução do desperdício e das perdas de alimentos não só no Brasil,
mas em todo o mundo”, disse Boujanic.
A rede, segundo Alcione Silva,
membro do corpo diretivo da Rede Save Food Brasil, foi criada pela ONU no ano
passado em diversos países. “O objetivo é, em um primeiro momento, trazer todos
os atores, instituições, empresas e simpatizantes que trabalhem o tema de
perdas e desperdícios no Brasil e, conforme essa rede for crescendo, se tornar
forte o suficiente para poder atuar em políticas públicas e inovações, trazendo
soluções para esse tema de desperdício no Brasil”, disse.
De acordo com Alcione, o
desperdício e a perda de alimentos no Brasil é muito grande, mas o país pode
contribuir com bons exemplos na mudança mundial desse cenário. Ela citou
iniciativas como o Disco Xepa, de distribuição de sopas feitas com sobras de
alimentos; a produção de tecnologia pela Embrapa; o Comida Invisível, que
pretende fazer um food truck para conscientizar crianças e escolas sobre o
reaproveitamento de sobras na cozinha; e o Fruta Imperfeita, que comercializa
alimentos considerados “imperfeitos”, tais como uma batata ou cenouras tortas.
Segundo Alcione, o desperdício e
a perda de alimentos é uma preocupação em todo o mundo porque tem um grande
impacto social, econômico e ambiental. “A gente precisa de 50% a mais de
demanda de oferta de alimentos até 2050 para alimentar essas 9 bilhões de
pessoas [estimativa de população para o ano]. Deveria ser até uma preocupação
muito maior por parte de todos os atores”, disse.
Marco regulatório – Para Viviane, uma das ações que poderia ajudar a
reduzir o desperdício e a perda de alimentos no país seria a adoção de um marco
regulatório sobre o tema. “Hoje temos vários projetos de lei mas que não foram
aprovados ou promulgados. É super-importante que tenhamos um marco regulatório
específico e que proporcione segurança jurídica para que as empresas realizem
suas doações de forma adequada e para que haja incentivos e subsídios para a
redução da perda e desperdício alimentar. Essa questão legislativa e
regulatória é extremamente importante”, disse.
Para a coordenadora de Mudanças
Climáticas do WRI Brasil, inventariar a perda e o desperdício de alimentos é um
primeiro passo importante que as empresas e que os países devem fazer. Depois
seria importante estabelecer metas de redução e estratégias para que ocorram.
Para Alcione, a grande
dificuldade diz respeito à cadeia logística. “Tanto a cadeia de distribuição
quanto a de armazenamento e o consumidor final tem uma grande perda de
alimentos por falta de infraestrutura. Nossas centrais de abastecimento não tem
uma infraestrutura adequada. Faltam cadeias e câmaras frias e falta
conscientização na parte de manipulação e embalagens. O Brasil tem um grande
problema de infraestrutura hoje e de logística nessa área. Diria que esse é o
problema mais grave que a gente tem no desperdício de alimentos”, disse a
integrante do corpo diretivo da Rede Save Food Brasil.
Mudar
para reduzir desperdício de alimentos
O hábito do brasileiro de ter
fartura na mesa ou até de “colocar mais água no feijão” precisam ser deixados
de lado para ajudar na redução do desperdício e da perda de alimentos no país.
Esse foi um alerta dado por Gustavo Porpino, analista na área de comunicação e
marketing da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) no
Sustainable Food Summit da América Latina, evento promovido pela Rede Save Food
Brasil, e que discutiu a perda e o desperdício com alimentos em todo o mundo.
“Precisamos educar os
consumidores para mudar e substituir o gosto pela fartura por um comportamento
mais frugal e de maior respeito pelo alimento que chega às nossas mesas”, disse
Porpino.
Segundo Porpino, os brasileiros
têm o hábito de ter um grande estoque de comida em suas casas – nem sempre
adequados para o armazenamento, além de fazer compras de alimentos por impulso
e prepará-los de forma excessiva à mesa. Outro problema que contribui para o
desperdício é o preconceito com o preparo das sobras de comida.
“O desperdício de alimento, no
final da cadeia, na etapa de consumo, não é apenas o ato de jogar comida fora.
Quando jogamos comida fora estamos desperdiçando o esforço de pesquisa. A
atividade agropecuária hoje no Brasil é rica em tecnologia e biotecnologia.
Então, todo o esforço de tecnologia, o suor do homem do campo e todo o custo de
logística e infraestrutura do varejo para manter, às vezes, o alimento
refrigerado, tudo isso está sendo descartado no final da cadeia. Desperdiçar
comida também é desperdiçar água, terra, recursos financeiros e impacta
negativamente principalmente no orçamento da classe média baixa brasileira”,
disse.
A perda dentro de casa não é o
maior problema do país em termos estatísticos, mas contribui, em muito, para
que as perdas e desperdício com alimentos no Brasil somem 40 mil toneladas por
dia, segundo Viviane Romeiro, coordenadora de mudanças climáticas do World
Resources Institute (WRI) Brasil.
Alimentos bonitos – Alcione Silva, membro do corpo diretivo da Rede
Save Food Brasil, entidade que tem apoio da Organização das Nações Unidas para
a Agricultura Alimentação (FAO) no Brasil, disse que os consumidores
brasileiros contribuem com cerca de 10% do desperdício de alimentos dentro da
cadeia logística, que envolve também a produção, distribuição e armazenamento
dos alimentos.
“O consumidor, para nós, é o
grande ator desse tema porque ele tem uma grande exigência estética. Ele só
leva para casa aquilo que é bonito, que está muito fresco. Produtos com
validade vencida, daqui uma semana você prefere escolher outro. O consumidor
acaba sendo um grande exigente de padrões estéticos e gerais dos alimentos e
acaba deixando para trás alimentos que são nutricionalmente tão saudáveis
quanto um alimento bonito”, disse.
Segundo Porpino, o grande
desperdício do consumidor, ou seja, de quem está no ponto final da cadeia
logística, se dá pelo “gosto da fartura” na mesa. “O desperdício se dá em casa,
em função do não aproveitamento da sobra do alimento por causa do gosto da
fartura. As vezes é uma intenção positiva, a mãe quer ver os filhos bem
nutridos e coloca muita comida no prato do filho ou faz com que os filhos
belisquem muito os alimentos entre uma refeição e outra e aí, quando chega o
horário do almoço ou do jantar, ele não vai comer tudo o que está ali sobre a
mesa”, disse.
O analista da Embrapa diz que também
há um efeito compensatório. “Quando a pessoa que está responsável por preparar
o alimento percebe que foi preparada uma refeição com valor calórico muito
grande ou que não é muito saudável, como um frango frito, por exemplo, ou um
feijão muito gordo, ela termina querendo ofertar um alimento mais saudável, uma
saladinha ou legumes cozidos e a criança termina comendo só aquele alimento que
tem mais sabor ou que é mais calórico e desperdiça o que é mais saudável”,
disse.
Segundo Porpino, ainda não é possível
avaliar no país o tamanho do impacto econômico que é produzido com o
desperdício de alimentos dentro de casa, porque não há pesquisas nesse sentido.
“Nos Estados Unidos, por exemplo, o Departamento de Agricultura tem um dado
alarmante: 31% das terras agricultáveis são ocupadas para produzir alimentos
que nunca serão consumidos e 41% da produção agropecuária americana, que é a
maior do mundo, não chega a ser consumida. Talvez o Brasil esteja próximo desse
patamar, já que vencemos aquela condição de sermos importadores de alimentos
para nos tornamos o segundo maior exportador de alimentos do mundo”.
Educação nutricional – Para evitar o desperdício com os alimentos dentro
de casa, Porpino diz que é fundamental que as escolas adotem a educação
nutricional para as crianças serem agentes de mudanças. “Também precisamos
atuar mais por meio da rede de enfrentamento da insegurança alimentar, como nos
programas sociais como o Bolsa Família ou de bancos de alimentos, para eles
caminharem mais juntos com iniciativas de educação nutricional”, disse.
Para Alcione é preciso aproveitar
melhor os alimentos, acabar com a questão da abundância ou de ter muita comida
em casa. “Isso acaba gerando muito desperdício nas residências”, disse a
integrante da Rede Save Food Brasil. Segundo ela, é preciso também criar
campanhas para reduzir a compra de alimentos por uma questão estética e comprar
de forma mais planejada.
Para Viviana, a mudança do hábito
do consumidor é fundamental não somente para reduzir o desperdício na ponta,
mas para que o próprio consumidor também exija e se organize como sociedade
civil e pressione as empresas por medidas que proporcionem uma redução dessa
perda e do desperdício global. “O consumidor tem esse papel duplo: tanto de
reduzir, na prática, o desperdício, como de pressionar, por meio da
conscientização, e de exigir produtos mais sustentáveis”, disse a coordenadora
do WRI Brasil.
Fonte: Agência Brasil
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