Brasil: líder mundial no uso de agrotóxicos
Além de permitir o uso de
pesticidas proibidos em outros países, o Brasil ainda exonera os impostos
dessas substâncias. O morango vermelho e carnudo e o espinafre verde-escuro de
folhas largas comprados na feira podem conter, além de nutrientes, doses altas
demais de resíduos químicos.
Estamos em 2016 e no Brasil ainda
se consomem frutas, verduras e legumes que cresceram sob os borrifos de
pesticidas que lá fora já foram banidos há anos. A quantidade de agrotóxicos
ingerida no Brasil é tão alta, que o país está na liderança do consumo mundial
desde 2008.
Desde este ano, o Brasil ocupa o
primeiro lugar no ranking mundial de consumo de agrotóxicos.
A Abrasco alerta que 70% dos
alimentos in natura consumidos no país estão contaminados por resíduos de pesticidas.
Os números falam por si nos últimos dez anos o mercado mundial desse setor
cresceu 93%, já no Brasil, esse crescimento foi de 190%, de acordo com dados
divulgados pela Anvisa.
Segundo o Dossiê Abrasco
(Associação Brasileira de Saúde Coletiva) – um alerta sobre o impacto dos
agrotóxicos na saúde, 70% dos alimentos in natura consumidos no país estão
contaminados por agrotóxicos. Desses, segundo a Anvisa, 28% contêm substâncias
não autorizadas.
“Isso sem contar os alimentos
processados, que são feitos a partir de grãos geneticamente modificados e
cheios dessas substâncias químicas”, diz Karen Friedrich, da Associação
Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
De acordo com ela, mais da metade
dos agrotóxicos usados no Brasil hoje são banidos em países da União Europeia e
nos Estados Unidos.
Segundo a Organização Mundial da
Saúde (OMS), entre os países em desenvolvimento, os agrotóxicos causam,
anualmente, 70.000 intoxicações agudas e crônicas.
A boa notícia, é que naquele
mesmo ano, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) iniciou a
reavaliação de 14 pesticidas que podem apresentar riscos à saúde. A má notícia
é que até agora os estudos não terminaram.
Governo
concede reduções e isenções de impostos para produção e comercialização de
agrotóxicos
A essa morosidade somam-se
incentivos fiscais. O Governo brasileiro concede redução de 60% do ICMS
(imposto relativo à circulação de mercadorias), isenção total do PIS/COFINS
(contribuições para a Seguridade Social) e do IPI (Imposto sobre Produtos
Industrializados) à produção e comércio dos pesticidas.
A constação é de João Eloi
Olenike (ao lado), presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação
(IBPT).
O que resta de imposto sobre os
agrotóxicos representam, segundo Olenike, 22% do valor do produto. “Para se ter
uma ideia, no caso dos medicamentos, que não são isentos de impostos, 34% do
valor final são tributos”, diz.
Recentemente, o consumo de
agrotóxicos esteve novamente no centro da discussão. A apresentadora Bela Gil,
que tem mais de 590.000 seguidores no Facebook, liderou um movimento para que a
população se mostrasse contrária ao uso do carbofurano, substância usada em
pesticidas em lavouras de algodão, feijão, banana, arroz e milho.
Isso ocorreu quando a Anvisa
colocou em seu site uma consulta pública sobre essa substância. Antes de Bela
Gil (abaixo) publicar um texto engajando seus seguidores, o resultado se
mostrava favorável à continuação do uso desse agrotóxico. Mas em poucas horas,
a apresentadora conseguiu reverter o resultado da consulta, mostrando que os
brasileiros querem que essa substância seja proibida também no Brasil, assim
como já é em países como Estados Unidos, Canadá e em toda a União Europeia. Por
e-mail, a chefe de cozinha adepta da culinária natureba disse por que liderou a
campanha. “Já existem estudos revelando a toxicidade e os perigos do
carbofurano”, disse.
“Essa substância é cancerígena,
desregula o sistema endócrino em qualquer dose relevante e afeta o sistema
reprodutor”.
Na bula do produto consta a
informação de que essa substância é “muito perigosa ao meio ambiente e
altamente tóxica para aves”. Orienta o usuário a não entrar nas lavouras que
receberam o produto por até 24 horas após a aplicação “a menos que se use
roupas protetoras”.
2,4-D e a
polêmica do ‘agende laranja’ usado na Guerra do Vietnã
Há exatos dez anos, desde 2006, a
Anvisa está reavaliando os riscos à saúde que o herbicida 2,4-D pode causar. De
nome estranho, essa substância era uma das que formavam o chamado Agente
Laranja, uma química que foi amplamente utilizada pelas Forças Armadas
norte-americanas durante a guerra do Vietnã.
Seu uso, naquele momento, era
para destruir plantações agrícolas e florestas que eram usadas como esconderijo
pelos inimigos. Mas, segundo a Cruz Vermelha, cerca de 150.000 crianças
nasceram com malformação congênita em consequência dessa substância. Os Estados
Unidos contestam esse número.
Por meio de nota, a Anvisa
afirmou que o parecer técnico de reavaliação do 2,4-D foi recentemente
finalizado e deverá ser disponibilizado para consulta pública no portal da
Anvisa nos próximos meses. A consulta pública faz parte do processo de
reavaliação das 14 substâncias realizado pela Anvisa.
Seis
pesticidas foram banidos e dois permanecem
Desde o início dos estudos, em
2008, seis pesticidas foram banidos e dois foram autorizados a permanecer no
mercado sob algumas restrições. Resta a conclusão dos estudos de outras seis
substâncias – dentre elas o carbofurano.
OMS
considera glifosato cancerígeno
O glifosato, usado para proteger
lavouras de milho e pasto, e que no ano passado foi considerado cancerígeno
pela Organização Mundial da Saúde, também está nesta lista que aguarda conclusões.
A demora para finalizar essa
reavaliação fez o Ministério Público entrar com uma ação, em junho do ano
passado, pedindo maior agilidade no processo. Na época, a Justiça acatou o
pedido e estabeleceu um prazo de 90 dias para que todos os estudos fossem
concluídos. Mas o setor do agronegócio também se moveu.
O Sindicato Nacional das
Indústrias de Defesa Vegetal (Sindivag) entrou com um recurso alegando que o
prazo não era suficiente.
Em nota, o Sindivag afirmou ser
“favorável ao procedimento de reavaliação”, mas que “o prazo concedido para
conclusão da reavaliação não era suficiente para que fossem adotados todos os
procedimentos previstos nas normas vigentes”.
O processo está agora na Justiça
Federal, que informou não haver prazo para o julgamento.
Apesar da demora, as reavaliações
dos agrotóxicos são um passo importante para a discussão do consumo dessas
substâncias no Brasil.
“A consulta pública da Anvisa
sobre o carbofurano foi importante para que o órgão e os especialistas
envolvidos obtivessem conhecimento do que a população pensa”, diz Bela Gil.
“A Anvisa pode se sentir mais
inclinada a tomada de decisão de realmente banir esse agrotóxico”.
Para Wanderlei Pignati, professor
de Medicina da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), a lentidão desse
processo ocorre porque há uma forte pressão de setores interessados na
comercialização dessas substâncias.
“As empresas querem fazer acordo,
mas não deveria caber recurso”, diz. “Queremos proibir todos os [agrotóxicos]
que são proibidos na União Europeia”, afirma. “Por que aqui são consumidos
livremente? Somos mais fortes que eles e podemos aguentar, por acaso?”.
Agrotóxicos
deveriam ter altos tributos e não ser isentos, o governo deveria fazer uma
revisão
Segundo João Olenike, do IBPT, os
agrotóxicos deveriam ter altos tributos, e não ser isentos. “Existe uma coisa
chamada extra-fiscalidade, que significa que, além da arrecadação, o tributo
tem também uma função social”, explica.
“Por isso, tributa-se muito a
bebida alcoólica e o cigarro: para desestimular seu consumo”.
Para ele, deveria-se fazer o
mesmo com os pesticidas. “O que valia na década de 70, [quando foi lançado o
Plano Nacional da Agricultura], não vale para hoje. O Governo deveria fazer uma
revisão”.
Os
alimentos mais contaminados pelos agrotóxicos
Em 2010, o mercado brasileiro de
agrotóxicos movimentou 7,3 bilhões de dólares e representou 19% do mercado
global. Soja, milho, algodão e cana-de-açúcar representam 80% do total de
vendas nesse setor.
Perguntas
e respostas sobre os agrotóxicos
Lavar os alimentos antes de consumi-los retira os agrotóxicos? - Não.
Lavar os alimentos pode contribuir para que apenas parte das substâncias sejam
retiradas, mas eles continuarão contaminados pelos agrotóxicos.
Água sanitária retira os agrotóxicos dos alimentos? - Não. Segundo
a Anvisa, até o momento não existem evidências científicas que comprovem a
eficácia da água sanitária ou do cloro na remoção ou eliminação de resíduos dos
agrotóxicos nos alimentos. A Anvisa orienta que se use uma solução de uma
colher de sopa de água sanitária diluída em um litro de água com o objetivo
apenas de matar agentes microbiológicos que possam estar presentes nos
alimentos.
Selo Brasil Certificado – Agricultura de Qualidade não garante
isenção do uso de agrotóxicos, mas que os alimentos são controlados.
Como diminuir a ingestão de agrotóxicos? - O ideal seria optar
pelos alimentos orgânicos, que venham com o certificado Produto Orgânico
Brasil, um selo branco, preto e verde.
Como esses alimentos são mais
caros e não estão disponíveis em todo mercado, há outras possibilidades, como
escolher produtos com o selo Brasil Certificado: Agricultura de Qualidade.
Esse selo não garante a isenção
do uso de agrotóxicos, mas significa que a origem do alimento é controlada, o
que aumenta o comprometimento de produtores com a qualidade do alimento.
Além disso, recomenda-se o
consumo de alimentos da época que, normalmente, recebem menos agrotóxicos para
serem produzidos.
Fonte: Diário Verde
EXCELENTE INFORMAÇÃO.
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