Piracema
É o movimento dos cardumes de peixe que nadam rio acima,
contra a correnteza, para realizar a desova no período de reprodução. A palavra
vem do tupi e significa algo como "saída de peixes", como os índios
descreviam esse fenômeno que ocorre com milhares de espécies no mundo inteiro.
Na maior parte do Brasil, a piracema coincide com o período das chuvas de
verão. "Quando a temperatura da água e do ar esquenta e o nível do rio
sobe em até 5 metros, os peixes percebem que é hora de vencer a correnteza para
se reproduzirem. Junto à cabeceira dos rios, a chance de sobrevivência dos
recém-nascidos é maior", afirma o biólogo Geraldo Barbieri, do Instituto
de Pesca de São Paulo, entidade do governo estadual. O ponto de partida é o
chamado lar de alimentação, onde os peixes encontram comida suficiente para
sobreviver na maior parte do ano.
Na jornada rio acima, o esforço contra a corrente é
essencial para o processo de reprodução, pois os peixes queimam gordura e
estimulam a produção de hormônios responsáveis pelo amadurecimento dos órgãos
sexuais.
A duração da viagem varia bastante. Peixes como as piavas
não vencem mais do que 3 quilômetros por dia, mas há registros de curimbatás
que chegaram a rasgar 43 quilômetros de rio em apenas 24 horas. Para todos,
porém, a jornada é cheia de perigos. Além de superar cachoeiras, predadores e
outros obstáculos naturais, esses animais precisam também vencer a pesca
predatória.
"Os peixes de piracema viram presas fáceis, pois sobem
os rios em grandes cardumes", afirma o biólogo Alexandre Lima Godinho, da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A solução é proibir a pesca na
época da migração e da reprodução, o chamado defeso, que geralmente vai de
novembro a fevereiro. A cada ano, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (Ibama) publica uma portaria estabelecendo quais
espécies não podem ser pescadas nesse período.
Contra a corrente
Alguns peixes sobem até 600 quilômetros de rio para procriar.
1 - No período de
chuvas, os cardumes iniciam a subida dos rios para a desova. Peixes como o
curimbatá e o dourado migram mais de 600 quilômetros até o local da reprodução.
No trajeto, o testículo dos machos aumenta de tamanho, fica repleto de sêmen e
esbranquiçado. Nas fêmeas, o aspecto amarelado das ovas indica a presença de
vitelo, rica reserva de alimento presente nos óvulos que sustentará os futuros
peixinhos.
2 - Na hora da
fecundação, a fêmea lança todo o seu conjunto de óvulos no fundo do rio. O
número varia bastante: a piava desova em média 160 mil óvulos, enquanto para a
fêmea de dourado o total pode ultrapassar 1,5 milhão. O próximo passo é dado
pelos machos, que despejam sucessivos jatos de sêmen sobre os óvulos, dando
origem a ovos fertilizados.
3 - Após a
fecundação, os peixes iniciam o caminho de volta. Os ovos são hidratados pela
água, aumentam três vezes de tamanho e são carregados pela correnteza. A
maioria não resiste e se torna alimento de peixes carnívoros. Só os que
alcançam as águas calmas de várzeas e lagoas marginais é que conseguem
sobreviver - menos de 1% do total.
4 - Poucas horas
após a fecundação, a larva rompe a casca do ovo e durante três dias tem a
reserva de vitelo como principal alimento. Após duas semanas, o peixe, com
pouco mais de 1 centímetro, já tem nadadeiras e escamas e consome
microorganismos aquáticos das lagoas marginais, locais ricos em alimentos e que
funcionam como verdadeiros berçários.
Dança nupcial
Na hora do acasalamento, a iniciativa é das fêmeas.
Durante o trajeto da piracema, os peixes "namoram"
até quatro horas antes de iniciarem o processo de fecundação. Esse período de
paquera entre machos e fêmeas parece um verdadeiro balé aquático. Nadando no
meio do rio, os machos são tocados por duas fêmeas, que vêm pelas laterais. Os
peixes se roçam, nadam em círculos e emitem um ruído estridente, enquanto
lançam óvulos e sêmen no fundo do rio.
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