Você sabe o que é SENCIÊNCIA


Bichos mais abaixo na escala evolutiva também teriam inteligência e sentimentos, só que em níveis distintos. O biólogo Marc Bekoff, da Universidade do Colorado confirma: “As evidências de hoje indicam que muitos animais sentem alegria, tristeza, pena…”, diz.

Então vamos lá, numa definição rápida, Senciência é a “capacidade de sofrer, sentir prazer ou felicidade”. A palavra senciência é muitas vezes confundida com sapiência, que pode significar conhecimento, consciência ou percepção. As duas palavras podem ser diferenciadas olhando-se suas raízes latinas: sentire é “sentir” e sapere é “saber”. Senciência, portanto, é a capacidade de sentir. É um conceito que combina os termos “sensibilidade” e “consciência”.

É curioso notar que “senciência” não consta no dicionário Aurélio, mas seu adjetivo, “senciente”, sim. O dicionário Aurélio de 1999 define “senciente” como “que sente”. Um bom sinal, já que procurei no meu exemplar de 1995 e não encontrei nem isso! Bom, para evitar equívocos linguísticos, a proposta foi o uso de um substantivo correspondente. Assim, o termo “senciência” será empregado de forma associada à consciência: capacidade de ter sentimentos associados à consciência.

Nos últimos anos, inúmeros estudos sobre a senciência dos animais vem sendo realizados, mas,  infelizmente, durante milênios, os animais foram vistos como seres de quinta categoria,  a serviço da humanidade, através da alimentação e do esforço, sempre em benefício dos seres humanos, num esquema estranho de “superioridade”.

No século XVII, René Descartes, proeminente filósofo que cunhou a emblemática frase “Penso, logo existo”, trazia consigo uma concepção meramente radical e antropológica, ou seja, que os animais eram seres mecânicos, desprovidos de dor, portanto, era amplamente favorável às pesquisas laboratoriais, como a prática da vivissecção.

Já no século XIX, Jeremy Bentham dizia que o ponto crucial entre a compaixão dos humanos perante aos animais não era se estes eram dotados de razão ou linguagem, mas sim se eram capazes de sofrer.
 
Por que estudar a Senciência Animal

Porque sem uma convicção da senciência, não podemos estudar Bem-Estar animal. Sendo um estado mental, bem-estar somente pode existir em seres sencientes e as respostas são importantes se quisermos evoluir na forma como tratamos os animais, de modo a causar menos sofrimento, seja em Animais de Produção, Animais de Laboratório, Animais de Trabalho e até aos nossos amados Animais de Estimação. 

Entendam, por cada um, que:

1 - Animais de Produção são todos aqueles que nos fornecem proteína animal para o consumo humano, seja ela em forma de carne, leite, ovos ou couro. Grande parte da população mundial consome esses produtos sem saber se esses animais foram tratados de maneira digna durante seu período produtivo.

2 - Animais de Laboratório são as cobaias usadas para os mais diversos testes de medicamentos, cosméticos, técnicas cirúrgicas e mais uma infinidade de finalidades das quais também o bem-estar é bem duvidoso, senão, cruel.

3 - Animais de Trabalho são aqueles usados comumente em fazendas para facilitar a tração de cargas pesadas e até nas cidades, puxando carroças igualmente pesadas que todos nós vemos frequentemente nas ruas trabalhando sob sol escaldante, magros e com péssimas condições de saúde.

4 - Sabemos, também, que não é difícil encontrar Animais de Estimação que sofrem maus tratos, apanham, passam fome e sede.

Apesar de polêmicas, deixo todas essas questões para um outro debate, quero aqui elucidar que os estudos a respeito do Bem-Estar Animal são, sim, importantes, quiçá fundamentais, em todas as áreas que utilizem os animais para qualquer que seja a sua finalidade.

Tal definição da Senciência Animal encontra grande ceticismo em alguns segmentos do ambiente científico. Por outro lado a senciência de um ser humano também não pode ser provada cientificamente. O acesso à mente e aos sentimentos de outros indivíduos é limitado porque não podemos adentrar a esfera privada de outro indivíduo, humano ou não. Ao se considerar a vida emocional dos animais, alguns podem ser bastante críticos, exigindo alguma prova científica. Ninguém algum dia provou o contrário, que os animais não sentem, mas esta incerteza raramente é levantada.

Entendia-se, primeiramente, que o córtex cerebral na espécie humana seria o responsável pela consciência.   Mas, depois de reiterados estudos, concluiu-se que as zonas cerebrais responsáveis pela inteligência, memória, bondade são as mesmas entre humanos e animais, dadas as devidas distinções na escala evolutiva de cada um.

Outra teoria da existência da senciência está baseada no fato de que os animais vertebrados apresentam todas as estruturas cerebrais envolvidas com os sentimentos em seres humanos. Segundo Peter Singer, a parte do cérebro associada às emoções e aos sentimentos, o diencéfalo, está bem desenvolvida em muitas espécies animais, particularmente nos mamíferos e pássaros. Por meio dessas semelhanças anatômicas, os cientistas têm observado que os animais respondem fisiologicamente à dor física e psíquica (medo, ansiedade, depressão, stress) da mesma maneira que os humanos o fazem. Por isso, quando sentem alguma dor, os animais se comportam de um jeito muito parecido com o dos humanos, e o seu comportamento é suficiente para justificar a convicção de que eles sentem dor e, portanto, são conscientes.

No entanto, é bastante controverso, mesmo entre ativistas e estudiosos dos direitos animais, quais animais não-humanos podem ser considerados sencientes. A senciência é amplamente reconhecida em todos os animais vertebrados – portadores de sistema nervoso central -, o que inclui quase todos os animais usados comumente pelo ser humano em suas atividades. Esta definição, porém, enfatiza apenas um critério para a existência de senciência: a manifestação (a nós, perceptível) da dor.

Existem, porém, outros sinais exteriores que evidenciam que outras espécies de animais experimentam o mundo de forma individual, como a existência de órgãos sensoriais que evidenciam uma necessidade de interpretar imagens, sons ou odores captados a partir dos respectivos sentidos. Esse conceito abrange não apenas animais vertebrados, mas também animais invertebrados como insetos, moluscos e aracnídeos e, portanto, corresponde a todos os animais que são tradicionalmente usados pelo ser humano. Por esta definição, apenas esponjas seriam animais não-sencientes.

Cuidado

Não se deve confundir senciência com autoconsciência, que é o conceito que define a consciência que cada um tem de ser um indivíduo único, separado dos demais seres. ParaPeter Singer, quanto maior o grau de autoconsciência, maior é a percepção que o animal tem do tempo. A autoconsciência geralmente é “constatada” pelo teste do reconhecimento no espelho. Tal teste, porém, tem como referência a visão, o sentido que é, de modo geral, privilegiado pelos seres humanos, e como tal, negligencia o fato de que outros sentidos (como o olfato ou a audição) são mais importantes para determinadas espécies animais. Desse modo, ele é tido como um método antropocêntrico de se constatar a autoconsciência de um animal. Sabe-se, por exemplo, que o cão não “passa” no teste do espelho e, no entanto, reconhece os indivíduos de sua espécie primordialmente através do olfato.

Num estudo focando a senciência animal, Hötzel e sua equipe demonstraram, em 2005, um trabalho com vacas leiteiras, em que os animais são capazes de sentir medo. Neste trabalho foram avaliados dois ordenhadores, onde um se apresentava neutro e o outro apresentava um comportamento agressivo. O estudo concluiu que os animais mantinham uma distância de fuga maior do ordenhador agressivo, ou seja, elas memorizaram e o identificaram como um perigo. Outro estudo realizado na UFPR com codornas japonesas de postura avaliou o comportamento compensatório de aves que foram criadas confinadas em gaiolas industriais e depois colocadas em um ambiente mais confortável. Observou-se durante a pesquisa que essas aves, no novo ambiente, exerciam atividades como ciscar e tomar banhos de areia na maior parte do tempo, e a isso se dá o nome de comportamento compensatório. Elas exerciam tais comportamentos com maior frequência que aves que foram criadas em um ambiente hostil.

Mesmo com inúmeras comprovações, em dezembro de 2012, um grupo de neurocientistas canadenses, chefiados pelo doutor Philip Low, realizou um novo teste. Ao fazer estudos comparados entre o cérebro humano ao de um animal, a equipe concluiu e subscreveu um manifesto ao mundo científico que os animais possuem consciência como todos nós.   Inclusive, emoções, sentimentos, o que, na verdade, já se sabia empiricamente.   Agora, há respaldo científco. Low citou também algo marcante: “Agora, não poderemos mais dizer que não sabíamos”.

Hoje, finalmente, sabemos que os animais começam a ser vistos com mais respeito, principalmente, por parte de nossa sociedade, e, inclusive, a cada dia que passa, novos adeptos e simpatizantes da causa em sua defesa surgem, aumentando o contingente de pessoas defensoras dos animais. Os governantes, a partir de agora, terão que atender ao clamor popular a favor dos animais, defendendo leis mais rígidas, em substituição à atual, tão incipiente e não punitiva para crimes de maus-tratos.

No momento a Lei federal 9.605/98, artigo 32, que ampara e protege os animais ainda é tímida, superficial, incipiente, não punindo os que mutilam, abandonam, maltratam. Contudo, comissões na defesa dos animais surgem a todo instante, como a Comissão de Proteção e Defesa dos Animais da Ordem dos Advogados do Brasil (CPDA/OAB), assim como comissões da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ) e Câmara Municipal.

Afim de informação, o artigo 32 dispõem sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, além de aplicar outras providências (que, infelizmente, não são aplicadas na prática):

Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:
Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.
§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.

Ao reconhecermos o sofrimento animal, temos a obrigação ética e moral de evitar o seu sofrimento desnecessário. Segundo as palavras de Charles Darwin: “Não existe nenhuma diferença fundamental entre o ser humano e os animais superiores em termos de faculdades mentais. A diferença entre a mente de um ser humano e de um animal superior é certamente em grau e não em tipo”. Portanto, cabe a cada um de nós, leitores conscientes, sencientes e informados, evitar aquela postura simplista de se “não temos certeza, então não existe”. A senciência existe e deve ser respeitada.

Fonte: www.caopanheirolabra.com

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