SUSTENTABILIDADE - Brasil tem papel fundamental nas questões ambientais


Numa época em que a escassez de água está em pauta, cada vez mais se faz necessário discutir o padrão de consumo da população. Até que ponto a falta de uma política ambiental efetiva, aliada a um plano de crescimento econômico sustentável, está ligada aos problemas que estão ocorrendo atualmente? Para o conselheiro do governo dos Estados Unidos (EUA) para Mudanças Climáticas e professor da Universidade de Virgínia, Janaki Alavapati, não há como discutir o desenvolvimento econômico sem levar em conta as questões ambientais. Para ele, as nações que não estão tratando o assunto como prioridade, podem pagar uma conta muito alta num futuro não muito distante.
Alavapati esteve em Curitiba na última semana para participar do lançamento do Portal do Projeto Cadastro Ambiental Rural (CAR), desenvolvido pelo setor de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Paraná (UFPR), e também do lançamento do livro "Direito Agrário Brasileiro de Acordo com o Novo Código Florestal". O CAR foi instituído pelo Novo Código Florestal e é um registro público eletrônico e obrigatório a todos os proprietários de imóveis rurais em solo brasileiro.
Alavapati também fez palestra na universidade e abordou os impactos das mudanças climáticas nas florestas naturais e plantadas no mundo e destacou alguns programas que estão sendo desenvolvidos na tentativa de reduzir a degradação do meio ambiente.
A preservação de florestas e bens naturais entrou na pauta de discussões de diversos governos há alguns anos, e é impossível debater sobre meio ambiente sem fazer ligação com a economia. O crescimento sustentável tem sido uma prioridade dos governos?
Acredito que sim. Cada vez mais os governos estão se dando conta que simplesmente o crescimento econômico sem atenção às questões ambientais, não será viável á longo prazo. Se os governos ignorarem esta questão terão que pagar uma conta muito alta mais adiante. Então é por isso que muitos governos estão mais preocupados. Os países mais pobres estão tentando desesperadamente satisfazer as necessidades do seu povo e, por isso, é muito difícil que eles possam prestar atenção nas discussões sobre o meio ambiente. Mas aquelas nações que conseguiram avançar economicamente sem abrir mão da qualidade ambiental têm lições a ensinar àqueles países que agora estão se desenvolvendo. Eles podem escolher o caminho e não precisam seguir determinado padrão, podem fazer escolhas.
E de que forma podem ser incentivadas novas iniciativas neste sentido?
Existem organizações como o Banco Mundial, a Fundação Rockfeller (Nova York) e o Instituto de Recursos Ambientais em Washington, que estão trabalhando e levando em conta a ideia de integrar ao cálculo do Produto Interno Bruto (PIB) os fatores ambientais. Por exemplo, um país pode dizer que seu PIB está crescendo 10% ao ano, mas se esta alta está ocorrendo à custa da degradação do meio ambiente, o resultado final poderá ser alterado. De certa maneira é absorver o que está sendo feito ambientalmente pela nação e incluir estas informações na composição do PIB final. É interessante, mas ainda precisa ser muito discutido.
Os governos estão de acordo com esta metodologia?
Não totalmente, mas o Banco Mundial já identificou ao menos oito países para iniciar esse projeto-piloto. A Colômbia é um destes países. Ruanda, na África, também está testando este projeto. Mas leva um tempo porque os governos querem mostrar que estão crescendo em taxas elevadas, não querem mostrar números pífios. Os BRICs (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) são países em crescimento e com uma população com poder de consumo em expansão.
Da mesma maneira, não seria necessário desenvolver uma conscientização em relação ao assunto?
Absolutamente. É um problema clássico quando alguns países experimentam o crescimento econômico. O padrão de vida sobe e as pessoas querem consumir, comprar carros, apartamentos, consomem mais água e energia. Energia é o componente chave porque é onde os governos estão prestando muita atenção para educar a sociedade. Querem que a população tenha um padrão de consumo de energia. Existem dados científicos que mostram que quando um país está mostrando este crescimento econômico, o consumo aumenta e a pressão no meio ambiente também aumenta. Mas quando um país atinge um nível estável de riqueza, então a qualidade ambiental dele melhora.
O Brasil ainda não atingiu um nível de riqueza total. Como o senhor avalia a situação atual do País na questão ambiental?
Ainda ocorre uma pressão ambiental significativa, mas existem programas como o Pagamento de Serviços Ambientais (PSA), por exemplo, que mostram uma mudança de perspectiva. Nesse momento ainda não está muito claro aqui no Brasil que estas iniciativas estão dando resultado. Entretanto há pesquisas que ressaltam que programas como o PSA, além do Novo Código Florestal, que determina que cada propriedade, deve manter 20% da sua área com mata nativa, são sinais de que já existe uma diminuição na pressão sobre o meio ambiente. Além disso, também é possível observar os impactos positivos dos programas de biocombustíveis. A China está crescendo de uma maneira avassaladora, mas ao mesmo tempo, eles também estão tentando atacar a pressão ambiental.
São Paulo enfrenta falta de água, o que impacta na geração de energia. Além disso, há alguns anos enfrentamos apagões. Não seria necessária a ampliação da matriz energética, para que o governo não dependa somente da geração de hidrelétricas e termoelétricas?
Certamente este desafio em particular acontece em todos os lugares, inclusive nos Estados Unidos. Alguns governos ainda estão hesitantes em usar fontes fósseis de energia, como carvão, por questões ambientais. Não há muita saída. Não podemos desprezar os combustíveis fósseis, pelo menos não num futuro breve. Mas baseados nas vantagens competitivas e ambientais, podemos pensar no gás natural, biocombustíveis e mesmo na bioeletricidade a partir da biomassa. Na Europa estão importando muita biomassa florestal para substituir o carvão. A energia solar e a eólica também são opções, mas mais do que isso é necessário educar a população sobre como conservar e economizar energia.
Uma questão que sempre gerou polêmica no Brasil é o conflito de interesses entre grandes produtores agrícolas e ambientalistas. Como avançar neste debate para que não se fique somente na troca de críticas?
É complicado. Quando falamos sobre agricultura não podemos deixar de lado a questão florestal. Até porque as florestas plantadas também são um tipo de agricultura. Além disso, existe uma falta de percepção por parte da sociedade de que as duas coisas são complementares. Para reverter este pensamento, existem muitas atividades educativas que estão sendo desenvolvidas nos Estados Unidos para mostrar iniciativas de crescimento econômico em parceria com questões ambientais. Alguns grupos, inclusive, levam estudantes a campo para ver florestas e matas ciliares ao longo dos rios, ressaltando o tipo de precaução que está sendo tomada para reduzir a poluição. Isso está nos ajudando para que hoje exista mais conscientização. Enfim, existem programas que estão engajando estes estudantes.
O Brasil desenvolve projetos de proteção ao meio ambiente e tem uma das maiores concentrações de mata nativa do mundo. Esta posição estratégica do País na questão ambiental é o que chama a atenção de muitos países, incluindo os EUA?
Certamente, se existe em algum lugar do mundo discussões sobre questões florestais, o Brasil é o primeiro lugar que vem à mente das pessoas. Seja nos EUA ou em qualquer outro lugar.
A implantação do Novo Código Florestal é um passo decisivo na tentativa de diminuir a pressão sobre o meio ambiente?
Conheço um pouco do Código, mas uma questão que me vem à mente é que ele é muito ambicioso e progressivo. É um passo absolutamente decisivo. Existem muitas características que apontam que talvez seja esse o caminho para reduzir a pressão sobre o meio ambiente. Há cerca de 150 anos vimos isso nos EUA. Na época o governo pediu para as pessoas derrubarem as matas e investirem somente no agronegócio. Mais recentemente, entretanto, foram tomadas algumas medidas no sentido contrário. Agora os impostos estão sendo usados para comprar estas áreas agrícolas justamente para manter a preservação ambiental.
Outros programas já implantados aqui, como o monitoramento do desmatamento na Amazônia e a criação do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), por exemplo, também são importantes?
Sim porque com a criação do Serviço Florestal Brasileiro, que é muito novo, foi desenvolvido o Inventário Florestal Nacional, e isso ajuda o governo de muitas maneiras. Este documento vai dizer onde se concentram as matas nativas e como as coisas vão andar. Conforme o tempo for passando será possível observar a quantidade e qualidade das florestas. Quando você tiver esta informação, sempre poderá intervir com políticas públicas. Visitamos o SFB e observamos que eles estão fazendo um progresso tremendo, mesmo iniciando os trabalhos, pois ainda é algo novo. O interessante é que durante esta visita verificamos que podemos ajudá-los na capacitação, porque nos EUA temos uma organização parecida com essa. Além das iniciativas já adotadas por governos e organizações não governamentais (ONGs) também é fundamental incentivar as novas gerações a desenvolver um pensamento diferente em relação ao meio ambiente.
As ONGs ambientais estão fazendo um trabalho ótimo em termos de formar esta conscientização, mas também de capacitar diversas pessoas. Além disso, ainda conseguem chamar a atenção de governos nacionais e internacionais. Então é algo extremamente importante. Agora, quando falamos em educação formal, já é mais complicado porque estamos encarando questões muito complexas. A menos que coordenemos este trabalho não poderemos resolver os problemas. Por exemplo, o Brasil ou os EUA, não podem, resolver sozinhos a questão de mudanças climáticas. Temos que nos juntar. E qual é a importância do trabalho conjunto entre governos e universidades?
Temos uma política, que está sendo usada nos últimos 50 anos em que o governo apoia faculdades a criarem e manterem cursos de engenharia florestal em todo os EUA. No Brasil isso seria muito importante porque, aos poucos, o País terá uma política estabelecida e não vai haver falta de verba para que a gente continue apoiando a formação de novos profissionais. Temos todas as informações detalhadas sobre este nosso programa e vamos compartilhar com os profissionais daqui. Não é somente uma questão acadêmica, mas sim o ensino superior e o governo, além do setor privado em alguns casos, trabalhando de maneira conjunta. Sei que é um projeto difícil, mas se os legisladores e a presidente daqui abraçarem esta ideia seria algo ótimo. Principalmente porque quando se fala em florestas o Brasil sempre vem à mente das pessoas de todo o mundo. O Brasil tem papel fundamental nas questões ambientais. Desta forma, se alguma iniciativa nova puder acontecer aqui, imediatamente isso será replicado e a ideia será comprada por diversos países, inclusive africanos e asiáticos. O País pode servir de modelo para muitas outras nações.
Matéria por Rubens Chueire Jr. em 02 de Novembro de 2014 

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