Qual o preço justo para realizar o Cadastro Ambiental Rural
Para responder essa pergunta,
vamos fazer algumas considerações iniciais, posteriormente faremos algumas
contas e, para finalizar, vamos mostrar o que quem realiza o CAR (Cadastro
Ambiental Rural) deve entender para ser profissional e evitar o pior para seu
futuro.
Trágico, não? - Mas é exatamente
isso, precisamos entender quanto custa para fazer o CAR de maneira
profissional.
A princípio falaremos sobre o
erro que vem sendo cometido quando se divulga que o CAR é gratuito e que
qualquer produtor rural pode fazer, sem a contratação de profissionais
específicos.
Essa informação poderia ser verdadeira se
considerarmos que o CAR é só o cadastramento propriamente dito, mas isso não é
verdade. O CAR não é só isso. Ele envolve várias etapas que ocorrem antes, durante
e depois da inserção das informações no sistema de cadastro.
Tudo começa com as informações
que o profissional contratado recebe do proprietário. Tendo ao menos o
perímetro da propriedade, é possível iniciar um processo de diagnóstico, onde
através de imagens de satélite atuais mapeia-se a vegetação nativa e as áreas
abertas existentes na propriedade.
Para dividir a vegetação nativa
mapeada em APP e RL, devem-se mapear os rios e nascentes da propriedade e é
neste momento que planejaremos a ida ao campo. Para fazer este mapeamento em
campo, pode-se fazer uso do geoprocessamento, que estima a localização das
nascentes e rios, de acordo com a declividade da propriedade, tudo de forma
remota. Esse tipo de preparação facilita (e muito!) o trabalho de campo, pois
será necessária apenas a conferência do que já foi mapeado no escritório,
chegando rapidamente ao destino desejado com a utilização de GPS.
Há casos, em que o trabalho de
campo se faz desnecessário, como por exemplo, em propriedades que não possuem
nascente ou rios em seus limites e que proprietário já possua o perímetro do
imóvel.
Trabalho de campo feito, hora de
voltar para o escritório e descarregar as informações coletadas. Uma pergunta:
com as informações de campo já conseguimos dividir a vegetação nativa em APP e
Reserva Legal?
A resposta é não! Ainda falta
mapear a área consolidada e é nesta hora que muitos profissionais têm
dificuldade. A única forma de garantir veracidade das áreas consolidadas é
através de imagens de satélite de duas datas: 2008 (mais precisamente 22 de
julho de 2008) e a mais atual (de preferência, de 2014).
A primeira data separa os que têm
anistia ou não pelos desmatamentos ocorridos dentro da sua propriedade e isso é
extremamente importante,pois as regras para delimitar as APP se modificaram com
o Novo Código Florestal para áreas consolidadas.
Áreas consolidadas mapeadas é
hora de dividir a vegetação nativa em RL e APP, contabilizar o passivo e também
os excedentes de vegetação existentes que poderão ser comercializadas na forma
de CRA – Cotas de Reserva Ambiental. Aqui vale uma dica: muitas vezes há
passivo em áreas de APP e excesso de vegetação na RL, o que faz com que essas
áreas possam ser comercializadas.
APP e RL mapeadas e
contabilizadas, já podemos fazer o cadastramento no SiCAR? Ainda não, mas já
passamos a etapa mais difícil. Agora é hora de saber se existem informações
georreferenciadas que ainda precisam ser cadastradas como Cobertura do Solo,
Servidão Administrativa e área de uso restrito.
E agora, vamos para o cadastro
das informações? - Ainda não.
Mas falta bem pouco! Basta só
levantar os documentos pessoais dos proprietários. Feito isso,agora sim vamos
para o cadastramento propriamente dito.
Antes, deixamos uma reflexão:
ainda não começamos fazer cadastro nenhum no SICAR e perceba quantas atividades
já ocorreram. Quanto vale o serviço feito antes do cadastro no sistema? Quanto
tempo (em horas) uma empresa ou um profissional gasta para realizar a
preparação dos arquivos e informações detalhada neste post?
Pois bem. O trabalho de
escritório pode ser mais fácil de estimar, mas e o campo? É muito difícil
estimar o tempo gasto em campo sem antes realizar o diagnóstico no escritório.
Fato é que fazer o serviço de uma propriedade com 4 nascentes preservadas e com
vegetação nativa remanescente é muito mais trabalhoso para mapear do que uma
sem nascente. Mapear rios em campo, quando não conseguimos mapear através de
imagens de satélite, também é trabalhoso.
Pronto, com todas as informações
em mãos, é hora de inscrever e cadastrar diretamente no SICAR, de seu estado ou
no Federal, já que em alguns estados o sistema ainda não foi integrado ou
liberado para o cadastro.
E de novo podemos fazer a mesma
pergunta, quanto tempo demora-se para realizar o cadastro do SiCAR? Devemos
considerar a quantidade de erros ocorridos durante o processo ou mesmo o
sistema ficar fora do ar em alguns lugares.
Feitas as
considerações, vamos às contas…
Primeiramente, algumas premissas:
Ao fazer as contas consideramos um custo por hora trabalhada do profissional em
R$50,00, o que representaria um salário liquido de R$ 3.000,00 por mês.
Consideramos também que um profissional consegue realizar o trabalho de
escritório, de campo e no cadastramento no SICAR em 1,5 dias (gastando 4 horas
cada uma das etapas). Muitas vezes pode-se demorar mais do que apenas 4 horas
para realizar cada etapa e isso faz com que os custos aumentem. Calculem bem
realmente quanto tempo demora cada etapa.
Colocadas as premissas, para as
etapas de escritório, campo e cadastro um custo de R$ 600,00 já foi gerado, R$
200 em cada etapa. Mas não podemos considerar apenas o custo do trabalho
realizado. Deslocamento, hospedagem e alimentação são custos que devem ser
computados para o trabalho em campo. Agora adicione parte dos custos fixos como
aluguel, luz, telefone e outras despesas que o profissional tenha e não se
esqueça dos impostos caso o profissional trabalhe com nota fiscal ou RPA
(Recibo Profissional Autônomo) o que teoricamente é obrigatório. Adicione ainda
o custo da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) e contabilize. Nenhum
profissional deveria estar cobrando menos que R$ 1.000,00 para realizar o CAR
de qualquer propriedade.
Se você é um profissional que
vende os serviços do CAR por R$ 500,00, cuidado, você está trabalhando de graça
ou mesmo pagando para trabalhar. Pense nisso. Mas não para por aí. Ainda há um
custo extremamente importante que deve ser levado em consideração, chamado
co-responsabilidade…
O profissional que fizer o CAR
para o proprietário é co-responsável pelas informações inseridas no SICAR. Caso
haja erros ou informações omissas, o profissional também poderá ser processado
e neste momento outros custos virão e se isso ocorrer, o profissional deve
guardar uma reserva de cada cliente para poder se defender caso seja movida uma
ação contra o mesmo. Um exemplo: o CAR da propriedade feita por um profissional
foi considerado ativo, de acordo com as informações inseridas no CAR. Tempo depois,
o banco que costuma financiar a safra do produtor recusa liberar o crédito,
pois se verificou um erro no CAR, o que gerou uma pendência. O proprietário
ficará feliz? Quem ele vai processar para reparar seu prejuízo? Esse foi só um
exemplo, mas existem outros tantos que poderá chegar até o profissional que fez
o CAR. Guarde pelo menos 30% dos valores cobrado de cada cliente para um fundo
de reserva caso o profissional seja acusado de co-responsabilidade de uma
pendência ocorrida no CAR.
Um bom exemplo foi a notificação
recebida pelo BNDES em Março de 2010, por co-responsabilidade pelos impactos
causados pela construção da Usina de Belo Monte apenas por financiar a obra
(para quem não soube, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
financia 80% da obra).
A co-responsabilidade não é
brincadeira e deve entrar no computo do preço cobrado do cliente. Tínhamos
chegado em R$ 1000,00? Agora adicione os 30% e chegamos num valor mínimo de R$
1.300,00. Profissional de verdade não pode cobrar menos de 1.300,00 para
realizar o CAR de qualquer propriedade a não ser que o profissional demore
menos de 1,5 dias para fazer todas as etapas (escritório, campo e cadastro no
SiCAR).
Cobrar qualquer valor menor do
que este é um prejuízo enorme para quem trabalha profissionalmente prestando
serviços. Muitas vezes, pensamos em ‘ser bacana’ e cobrar uma quantia amigável
para algum conhecido ou para um conterrâneo, e acabamos por sofrer as
consequências.
Sendo assim, olhar para o CAR
como uma coisa solitária, é o primeiro erro cometido, dificultando ainda mais
para que o CAR ocorra com sucesso. Baratear o preço final para o cliente é o
principal, pois valores muito baixos não cobrem as despesas, os esforços e
também não serve de ressalva para possíveis problemas. Quem quer trabalhar com
o CAR deve ter em mente os riscos corridos e procurar aplicar um preço justo,
não somente atrativo. Senão, acaba por perder tempo, dinheiro e principalmente,
o profissionalismo.
Fonte: Luiz Eduardo Faria
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