Uma ética ambiental para o futuro
Passado mais de cinquenta anos depois da
assinatura da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o mundo necessita de
uma nova declaração universal, desta vez de obrigações humanas, tanto dos
indivíduos quanto dos estados, a fim de deter a progressiva deterioração do
ambiente de nosso Planeta. Há no mundo milhares de organizações que atualmente
se ocupam dos direitos das pessoas, mas somente um punhado está se preocupando
com o estabelecimento de obrigações humanas.
O primeiro resultado real nesta
área, a Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, pode até mesmo
ter sido insuficiente, mas deu uma ideia do quanto falta para ser feito em
matéria de obrigações supranacionais relacionadas à salvaguarda do ambiente e
dos recursos mundiais, e com a necessidade de dar uma base sustentável à vida
humana e animal.
Até agora a regra de ouro de “não
faça aos outros, o que não gostaria que fizessem a você” serviu como base para
todas as éticas. Devemos transportar esta regra para as relações entre países
ricos e pobres, e entre gerações.
Teríamos gostado se as pessoas
que viveram neste Planeta há cem, mil ou cem mil anos tivessem depositado
enormes quantidades de lixo nuclear no fundo do oceano ou em buracos, levando à
extinção numerosas espécies de plantas e animais, ou queimado tanto carvão e
petróleo como nós fazemos? Sendo assim, fica claro que não temos o direito de
fazer o mesmo.
Como já foi corretamente
observado, o Planeta Terra não é de nossa propriedade e nem o herdamos de
nossos ancestrais. Na realidade, o estamos pedindo emprestado de nossos
descendentes. Mas estamos deixando atrás nós um mundo que vale menos do que
aquele que pedimos emprestado.
A nossa é a primeira geração que
está afetando o clima terrestre e a última geração que não terá que pagar o preço
por ter feito tal coisa. Tendo em vista o que está ocorrendo em nosso Planeta,
nos atreveríamos a nascer na metade do próximo século?
Sabemos que estamos em uma rota
de colisão com a natureza e de que modo devemos mudar nosso comportamento para
evitar o desastre. Nosso sistema econômico está colocando em perigo a
capacidade do Planeta de renovar-se a si mesmo. Muitas decisões estão sendo
tomadas por pequenos grupos com a intenção de obter lucros em curto prazo sem
levar em conta o que seria uma justa divisão dos recursos mundiais.
Se a cultura ocidental tivesse
êxito em exportar sua ideologia consumista para a África, Índia, China e
Sudeste Asiático, por exemplo, a catástrofe global seria inevitável.
Certamente, a catástrofe já é uma realidade em muitos lugares.
As
perguntas a se fazer neste início de Século 21 são as seguintes
Que mudança de consciência está faltando? Quais são as qualidades de
vida mais importantes? Quais são os valores sustentáveis? O que é uma boa vida?
A questão já não é mais se
necessitamos de uma nova ética global, mas sim como obter uma “ética para o
futuro” e como ela pode ser assimilada de modo a levar a uma nova direção
política. Hoje em dia muitas pessoas têm um bom conhecimento dos desafios que
este mundo está enfrentando. Muitos, inclusive, talvez tenham o que se poderia
chamar de uma consciência global, ou uma consciência ecológica. Os políticos
também estão se dando conta do que está ocorrendo e de uma maneira muito melhor
do que demonstram na prática.
Este é o paradoxo: sabemos que o tempo está se esgotando para nós, mas
não agimos para mudar completamente as coisas antes que seja demasiado tarde.
Estamos enfrentando o colapso do ambiente planetário. Mas onde está a vontade
política? Que políticos se atreveriam a pedir um pequeno sacrifício a fim de
adotar um novo e necessário curso para salvar o futuro de nossas crianças, da
civilização e da dignidade humana?
Devemos lutar pela proteção do
ambiente e por uma divisão mais equitativa dos recursos do planeta.
Diz-se que uma rã posta na água
fervente saltará rapidamente para fora, mas se a água for aquecida
gradualmente, ela não se dará conta do aumento da temperatura e tranquilamente
se deixará ferver até morrer. Que coisa semelhante possa estar ocorrendo à
nossa geração com respeito à gradual destruição do ambiente é ainda algo a ser
demonstrado ou desmentido. Uma coisa é certa: ninguém pode nos salvar a não ser
nós mesmos.
O futuro não é algo que
simplesmente acontece por si mesmo. Estamos criando o amanhã neste mesmo
momento. Hoje em dia muitas pessoas sentem-se como meros espectadores dos fatos
globais. Mas devemos aprender que todos nós somos atores e que estamos
modelando nosso futuro agora mesmo.
Fonte: Jostein Gaarder
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