Necessidade de controle da poluição visual


Como garantir a preservação estética de uma cidade? Como proteger o paisagismo urbano?
Inúmeros componentes da paisagem urbana comprometem sua beleza. A má conservação de fachadas de imóveis, a falta de arborização e de ajardinamento, a "pichação" de prédios e monumentos, o excesso de concreto, antenas, fios e postes de distribuição de energia e cabos telefônicos são alguns exemplos. Interessa-nos, particularmente, apontar a poluição causada pela inserção abusiva de cartazes no cenário da cidade.
Conceito de poluição visual
Resta então definir, pois, o que é poluição visual?
Poluição visual é pois, consequência e resultado de desconformidades de todas essas situações e também o efeito da deterioração dos espaços da cidade pelo acúmulo exagerado de anúncios publicitários em determinados locais, porém, o conceito mais abrangente é aquele que diz que há poluição visual quando o campo visual do cidadão se encontra de tal maneira que a sua percepção dos espaços da cidade é impedida ou dificultada.
O que impede ou dificulta a percepção da cidade pelos seus cidadãos?
Podemos enumerar:
•A falta de uma consciência do público e do privado e de uma educação ambiental. O conceito de que a coisa pública não é de ninguém e que portanto ninguém é responsável por ela e que nela se pode fazer o que se queira, faz com que não somente a população em geral, mas também os órgãos gestores das cidades tratem o espaço público como espaço a ser abandonado ou maltratado (estacionamento de carros nas vias, colocação de placas de publicidade nas calçadas, comércio nas calçadas, mesas de restaurantes e outros objetos nas calçadas, abandono de lixo e  materiais de demolições nas calçadas e ruas,  etc.);
•A desordenação de elementos presentes na paisagem (equipamentos e mobiliário urbanos tais como placas de logradouros, placas de trânsito, bancas, cabines telefônicas, postes de iluminação pública, lixeiras, floreiras, etc.) torna difícil a compreensão dos espaços da cidade, ora, a inadequação da localização de mobiliário e equipamentos urbanos comprometendo a circulação, as perspectivas, os padrões urbanísticos, a segurança dos pedestres e o consequente aparecimento de espaços extremamente fragmentados e inúteis;
•O recobrimento da fachada dos edifícios por meio de anúncios publicitários e a colocação de anúncios cada vez maiores e em grande quantidade mascara a identidade dos espaços da cidade, tornando-os inócuos e todos semelhantes, dificultando a orientação do cidadão e escondendo referenciais que fazem com que a cidade se diferencie de outras (sítios naturais, edifícios históricos, praças, parques, etc.). O acúmulo de elementos publicitários nas fachadas de estabelecimentos comerciais e de serviços recobrem inclusive edifícios representativos da cidade. Os anúncios passam a encobrir, ocupar o lugar ou substituir os marcos referenciais dos lugares;
•A colocação de publicidade em locais que prejudica a sinalização de trânsito e/ou que impede a visualização e visibilidade  causa problemas de segurança além de interferir no direito do cidadão;
•A legislação (muito farta em leis e decretos) pontual não leva em conta a paisagem da cidade. Desde as leis de uso do solo, por exemplo que permitem a verticalização sem considerar as visuais ou a possibilidade de percepção da topografia da cidade até uma legislação atual de anúncios bastante genérica e permissiva em todos os lugares, tornando seus espaços muito iguais;
•A gestão da paisagem é inexistente. Não há projeto integrado nem cadastro e  nem coordenação das ações que são desenvolvidas no espaço da cidade. A fiscalização é quase inexistente. Por outro lado, inexiste também, uma manutenção de serviços urbanos, fundamental para que a qualidade da paisagem urbana seja preservada. Assim, por exemplo, a conservação das fachadas e das calçadas, na maioria das vezes, deixa a desejar. Enfim, a deterioração física e ambiental revela uma omissão sucessiva de  gestões municipais, baixos padrões de manutenção urbana contribuindo para a degradação ambiental;
•A decisão de transformação dos espaços da cidade vem de cima e a participação da população é pequena. Esta situação faz com que a população não se sinta dona nem responsável pelo lugar que passa ou mora;
Inexiste uma política de identidade visual  e consequentemente formas alternativas para a melhoria da qualidade de vida e propostas de soluções viáveis para a problemática da intensa poluição visual.
Vivemos num sistema capitalista que se caracteriza pela livre concorrência. Empresas produtoras de bens e serviços e estabelecimentos comerciais disputam avidamente o mercado consumidor. Nessa disputa por mercado, a publicidade exerce um papel de muita relevância. Diz antigo ditado que "a propaganda é a alma do negócio". É do interesse de toda empresa propagar sua marca, logotipo ou mensagem para fixá-los na mente do consumidor. Dentre as diversas modalidades de publicidade, temos aquela veiculada pela exibição de cartazes. É certo que "sempre que um produto ou serviço necessite ser anunciado com uma grande dose de impacto, o outdoor é sempre um dos meios mais lembrados. Sendo um meio que participa diretamente da paisagem urbana (e consequentemente no cotidiano das pessoas), e com as proporções ampliadas que possui, o outdoor está sempre diretamente relacionado com o conceito de impacto da comunicação". O espaço publicitário em locais de grande visibilidade é vendido no mercado e possui valor econômico. Os estabelecimentos comerciais, no afã de chamar a atenção de potenciais clientes, instalam letreiros indicativos em suas fachadas, que muitas vezes, por suas dimensões e altura de instalação, parecem desempenhar também função publicitária, extrapolando a mera indicação do estabelecimento.
Existem empresas que se dedicam à venda desses espaços aos interessados, que despendem boa soma de dinheiro para ter exposta ao público sua marca, logotipo ou mensagem publicitária. A tecnologia tornou-se aliada dos anunciantes. Os cartazes tornaram-se sofisticados, iluminados, instalados em locais altos, de grande visibilidade. Telões eletrônicos permitem a exibição de imagens em movimento. Inovações como anúncios veiculados por helicópteros, aviões e balões surgem nos céus.
É evidente que o excesso de cartazes e outros elementos de comunicação visual interfere nos padrões estéticos de uma cidade. A falta de um controle eficaz permite que a profusão de letras e imagens acabe por dominar a cena urbana, escondendo árvores e fachadas e parcialmente o próprio céu, constituindo um fator de stress.
Alguns equipamentos urbanos comprometem a paisagem mas são necessários. É o caso dos semáforos e das placas de sinalização de trânsito. Existe uma justificativa razoável para sua presença. São uma interferência inevitável na paisagem urbana.
Com relação aos cartazes publicitários e até indicativos , no entanto, nenhuma justificativa válida pode ser apontada para sua presença abusiva no cenário da cidade.
Sobre o impacto dos anúncios, a própria Central de Outdoor (entidade que congrega empresas que exploram a publicidade externa) reconhece: "Praticamente, o outdoor é uma mídia compulsória. Ele está nas ruas, praças e avenidas, aberta a toda população. Não necessita ser comprada, nem ligada, nem folheada. Não se cobra ingresso para vê-la. O consumidor é indefeso a uma mensagem veiculada em outdoor." E lança as perguntas: "Como calcular quantas pessoas por dia estão vendo uma mensagem em outdoor? Como calcular quantas vezes um consumidor foi impactado pelo mesmo cartaz, num determinado período? " Uma empresa de comunicação visual anuncia em folheto promocional "algumas das vantagens da mídia externa, em topo de prédios e empresas: possibilita ao anunciante ter um ponto exclusivo, que se torna referência marcante da paisagem urbana; mídia exposta 24 horas aos olhos do consumidor, impactando o público alvo diversas vezes ao dia".
É preciso que se restabeleça o direito do cidadão à fruição da paisagem urbana, sem qualquer interferência ou mensagem, que não as relativas à orientação e ao bem comum. É impiedoso submeter as pessoas ao estímulo constante de consumo ou de ações a que elas, na maioria dos casos, não têm condição de corresponder. Aqui, ao contrário do que ocorre com outros meios de comunicação, o receptor da mensagem não tem condição de suprimi-la, e não anui tacitamente ligando um aparelho ou folheando uma revista ou jornal.
Não se pode pregar a eliminação total dos anúncios externos nas cidades, embora tal solução radical viesse a agradar aos olhos mais sensíveis.
A tutela do paisagismo, no entanto, implica na necessária limitação à inserção de cartazes na cidade. Poucos cartazes e de pequenas dimensões: não parece ser possível outra fórmula. Se a proliferação de cartazes é inimiga da estética urbana, a restrição à sua colocação deve ser preocupação prioritária de uma lei que pretenda impedir a poluição visual. Ou será que os munícipes não são nada além de "consumidores", que devem ser atingidos na condição de "público alvo"?
 
Fonte: Prof. Dr. Issao Minami

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