Impacto de plástico oculto nos mares
Foram encontradas tartarugas que
faziam ninhos no meio de garrafas plásticas, isqueiros e brinquedos. E
descobriu filhotes de albatrozes mortos ou à beira da morte porque seus pais os
haviam alimentado com plástico. Alguns dos filhotes morrem quando objetos
pontiagudos perfuram seus corpos, outros por fome, com seus estômagos cheios de
plástico que não conseguem digerir. Sabemos há algum tempo que o plástico é uma
ameaça aos albatrozes, mas quão perigoso é o lixo plástico para outras espécies
inclusive o homem.
Parte do plástico encontrado nos
nossos oceanos foi jogada no mar ilegalmente. Uma outra porção é lixo da pesca,
mas a maioria vem da terra, de lixões mal administrados e de lixo industrial. O
lixo que flutua nos mares é carregado por grandes sistemas de correntes
marítimas rotativas, como grandes redemoinhos, impulsionados pelo movimento de
rotação da Terra e os ventos.
O arquipélago do Havaí está
situado no meio de um desses sistemas, conhecido como o Giro do Pacífico Norte,
um entre cinco sistemas interconectados de correntes oceânicas. Cada um desses
sistemas forma uma espiral, girando em torno de um ponto central, levando
detritos para o seu interior. Essas espirais também podem expelir materiais em
direção aos continentes Ártico e Antártico, espalhando o plástico por todo o
planeta. O plástico é feito para durar, por isso, se degrada muito lentamente
nos mares, despedaçando-se em fragmentos cada vez menores. Esses pedaços
minúsculos de plástico são conhecidos como microplástico.
Mudanças
Hormonais
Para demonstrar o que acontece
com o plástico que se degrada no oceano, o especialista em poluição marinha
Simon Boxall, do Centro Nacional de Oceanografia britânico em Southampton, na
costa sul da Grã-Bretanha, filtrou 400 toneladas de água do mar e levou os
detritos para análise em seu laboratório. A olho nu, era possível ver lama,
galhos e penas. Mas observada ao microscópio, a amostra continha pequenas
partículas de plástico.
Havia pedaços de cordas plásticas,
sacolas e fragmentos coloridos, alguns com forma pontiaguda. Algumas das
partículas tinham menos de um milímetro de espessura, o mesmo tamanho de
organismos vivos presentes na amostra fitoplâncton
(organismos vegetais) e zooplâncton (organismos animais).
"Tem havido muita pesquisa
nos Estados Unidos para investigar como o plástico entra na cadeia
alimentar", diz Boxall. "Certamente foi demonstrado que ele entra nos
bivalves, moluscos e ostras no fundo do mar, e exerce um efeito sobre eles."
"Eles acumulam
biologicamente o plástico na medida em que filtram a água. Isso concentra o
plástico e efetivamente transforma alguns dos moluscos em hermafroditas",
afirma. "Há alguns anos, achávamos que aquilo era só fibra, e que não havia
grande impacto, mas sabemos agora que essas partículas muito pequenas podem
imitar coisas como o estrogênio."
O pesquisador acrescenta, no entanto, que o efeito verdadeiro ainda não
é conhecido.
"Essas partículas plásticas
são como esponjas, são ímãs que atraem contaminação, coisas como o
tributilestanho (substância extremamente tóxica, usada em pinturas de barcos).
As minúsculas partículas absorvem esses materiais e efetivamente se tornam
muito tóxicas", descreve Boxall.
"Não sabemos ainda se isso
depois tem impacto sobre a cadeia alimentar. Ainda é cedo para saber quão longe
na cadeia alimentar essas partículas plásticas penetram."
Efeito
desconhecido
Especialistas do centro de
Ecologia e Biologia Marinha da Universidade de Plymouth, na Grã-Bretanha,
estudam o impacto de poluentes sobre oceanos e rios e sobre as criaturas que os
habitam. O cientista Richard Thompson, que trabalha no centro, foi o primeiro a
descrever os minúsculos fragmentos de plástico como 'microplásticos', já em
2004.
"Há duas preocupações do ponto
de vista toxicológico", diz Thompson. "Há o fato de que plásticos são
conhecidos por absorver e concentrar substâncias químicas da água do mar."
"E a segunda questão diz
respeito a substâncias químicas que foram introduzidas nos plásticos desde o
momento da fabricação para a obtenção de qualidades específicas, como
flexibilidade, ou substâncias retardadoras de chama e antimicrobianas."
Com o plástico disperso na
natureza em pequenos fragmentos, resta saber se existe a possibilidade de que
essas substâncias químicas também sejam liberadas no meio ambiente.
E a resposta, segundo Thompson, é
que são necessárias mais pesquisas sobre o assunto.
A equipe do especialista examinou
peixes encontrados no Canal da Mancha, cerca de 500 indivíduos de dez espécies
diferentes, entre eles, a cavala e o poor cod (peixe da família do bacalhau).
Os resultados do estudo foram publicados no Marine Pollution Bulletin (Lusher
et al, MPB, December 2012).
"Encontramos plástico
microscópico nas vísceras de todas as espécies, mas em quantidades
relativamente baixas - uma ou duas partículas por peixe - então certamente não
há um risco do ponto de vista da população humana que consome esses peixes
porque normalmente não comemos as vísceras", afirma Thompson.
Mas se o plástico em si não é
consumido por humanos, haveria perigo de contaminação da carne do peixe pelas
substâncias tóxicas contidas no plástico, e por consequência, do homem que come
o peixe?
Thompson diz que ainda não é
possível saber. "As quantidades de plástico que estamos encontrando são
tão pequenas que qualquer risco do ponto de vista do consumo humano é
inexistente, ao menos pelo que sabemos no momento", diz o pesquisador.
"Obviamente, isso é algo que precisamos pesquisar mais."
O especialista acrescenta, no
entanto, que a equipe quer saber se o plástico representa um perigo para os
animais que o ingerem, tanto por sua presença em seus organismos como pela
possibilidade de que ele transporte consigo substâncias químicas nocivas.
Portanto, se por um lado o
impacto do alastramento do lixo plástico pelos mares pode ser avaliado por
especialistas que estudam a vida marinha em lugares remotos como o Havaí, o
efeito do plástico "oculto" espalhado pelos oceanos é mais difícil de
avaliar.
Fonte: www.bbc.co.uk
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