Biodiversidade, Agrobiodiversidade e Agroecologia
Hoje, um grande desafio para a
agropecuária, principalmente em relação à inovação tecnológica, é a harmonização
do setor produtivo com os princípios da sustentabilidade. Cada vez mais, a
sociedade tem exigido maior e melhor compatibilização da produção agrícola com preservação
ambiental e conservação dos ecossistemas.
Com essa preocupação, a pesquisa
agropecuária tem empenhado esforços para trazer soluções que aliem as demandas
da sociedade por alimentos, desenvolvimento econômico e geração de emprego e
renda com a sustentabilidade dos processos produtivos. Assim, a ciência busca
identificar nas tecnologias estudadas e desenvolvidas componentes que garantam
a preservação do meio ambiente, alcançando, dessa forma, a conservação da biodiversidade
e a produção de alimentos saudáveis. Tudo isso amplia a sustentabilidade do
agronegócio, oferecendo mais qualidade de vida ao produtor e ao consumidor.
Exemplo do avanço da
sustentabilidade no campo é o aumento da produtividade de grãos no Brasil. Em
34 anos, entre 1976 e 2010, a produção cresceu 235%, enquanto a área usada
aumentou somente 32%. Com isso, foi possível deixar nas condições naturais
áreas que seriam certamente ocupadas nos diferentes biomas brasileiros.
Isso significa trabalhar e
reconhecer o avanço da tecnologia e a conservação da biodiversidade brasileira
como o patrimônio nacional que é.
Por isso, saber usá-la de forma
adequada, aproveitando sua capacidade de gerar produtos e serviços, significa
usufruir de benefícios e oportunidades de desenvolvimento para todos. E usá-la
de forma adequada é adotar alternativas sustentáveis para o uso, conservação e
manejo de espécies de plantas, animais e microrganismos.
Para garantir a relação adequada
homem-ambiente, é preciso conhecer a nossa biodiversidade. Para isso, cientistas
e pesquisadores montam coleções biológicas de referência, que ajudam em estudos
da diversidade da flora e da fauna brasileira. Atualmente, a Embrapa possui mais
de 80 coleções biológicas. Somente no Herbário do Instituto Amazônico do Norte
(IAN), a Embrapa mantém mais de 180 mil exemplares de plantas desidratadas, 700
frutos, 28 mil fotografias de plantas e uma coleção de Tipos Nomenclaturais, ou
seja, plantas usadas na descrição de novas espécies, com mais de 2.000
exemplares da flora da Amazônia.
Outro exemplo vem da Embrapa
Recursos Genéticos e Biotecnologia – Brasília (DF), que mantém em seu acervo mais
de 80 mil exemplares de plantas desidratadas, 400 frutos e uma coleção de mais
de 160 Tipos Nomenclaturais (plantas tipo usadas na descrição de novas
espécies), com mais de 5,7 mil espécies da flora brasileira.
Essas coleções encontram-se
organizadas em bancos de dados e são amplamente utilizadas para caracterizar, avaliar
e documentar a biodiversidade de cada região, possibilitando assim aumento do
conhecimento e geração de tecnologias apropriadas para a sustentabilidade produtiva
e ambiental.
Outro foco que se busca ao
pesquisar e desenvolver uma tecnologia é a avaliação, recuperação e manutenção da
biodiversidade nos diferentes ecossistemas. Os nossos biomas são estudados para
que seja possível a caracterização das dinâmicas da flora, da fauna, de microrganismos,
do ambiente físico e sua interação, social e econômica com as diversas
comunidades. Aliado a esse conhecimento, é possível oferecer soluções que proporcionam
a conservação da água, a diminuição da erosão, além da preservação e manutenção
da biodiversidade, gerando benefícios ambientais e econômicos de valor quase
incalculável.
O
potencial da flora brasileira
Entre as diversas potencialidades
da flora nativa do Brasil, as espécies frutíferas destacam-se não só pelo
elevado valor econômico, tanto no comércio de frutas frescas, na produção de
matérias-primas para a agroindústria, como também por serem importantes fontes
de alimento e de sustento para as populações de baixa renda, nos vários biomas
do País. Frutas como castanha-do-brasil, açaí e cupuaçu, na Amazônia; pequi,
araticum, macaúba, jatobá, mangaba e buriti, no Cerrado e no Pantanal; umbu e maracujá-do-mato,
na Caatinga; butiá e araçá, no Pampa, são alguns exemplos de espécies nativas
com grande potencial frutífero que possibilitam a geração de renda tanto pela
comercialização de frutos in natura como pelo desenvolvimento da agroindústria
de base familiar na fabricação de doces, geleias, sucos, polpas, licores, entre
outros derivados.
O papel das instituições de
pesquisa agropecuária tem sido fundamental no desenvolvimento de alternativas
para o aproveitamento dessas frutas e na comercialização de seus produtos.
O umbuzeiro, espécie endêmica
(que só ocorre nesse ecossistema) da Caatinga, é um bom exemplo para destacar resultados
promissores nesse sentido. Os frutos maduros de umbu se deterioram com
facilidade, em dois ou três dias, dificultando sua comercialização em longo
prazo. Com estudos e análises de pós-colheita e de processamento, foi possível
gerar produtos derivados, prolongando a vida de prateleira desses frutos.
Soluções e tecnologias como essa fazem toda a diferença para o Brasil e para o
brasileiro, pois contribuem para geração de emprego e renda, principalmente das
mulheres do semiárido brasileiro. Antes as famílias viviam de renda somente na
época da safra, agora podem gerar e comercializar produtos derivados do
umbuzeiro também na entressafra. E os resultados não param por aí. O umbu e
seus produtos já fazem parte da merenda de escolas municipais da Bahia, além de
serem exportados para países como França e Itália.
A riqueza
da fauna
Outro exemplo do uso sustentável
da biodiversidade está na criação racional de abelhas sem ferrão, a
meliponicultura.
Nos últimos 10 anos, pesquisas e
estudos que melhoram os resultados da produção têm apresentado cada vez mais retorno.
Adaptações como novos modelos de caixas e sistemas adaptados às diferentes
espécies permitiram que a atividade passasse de extrativista ou exploração
rudimentar para criação racional no Norte e Nordeste do Brasil.
Além disso, com a capacitação de
agricultores, técnicos e estudantes, foi possível divulgar métodos apropriados
que proporcionaram aumento da produção e sustentabilidade econômica do setor,
pela otimização de processos e a caracterização e conservação dos produtos
oriundos dessas abelhas. Para os meliponicultores que adotaram essas práticas,
os recursos obtidos com a atividade já representam expressiva contribuição de
renda em sua propriedade, seja pela produção de mel, seja pela comercialização
de ninhos.
A
agroecologia e agrobiodiversidade
A agroecologia é definida como o
estudo das funções e interações dos agroecossistemas, da biodiversidade funcional,
dos recursos naturais e dos saberes locais.
Sistemas agroecológicos, por sua
vez, promovem e relacionam-se com a agrobiodiversidade, dentro de um processo
de relações e interações entre aspectos socioculturais, manejo ecológico dos
recursos naturais e manejo integrado dos agroecossistemas, que dá origem à noção
de sustentabilidade social, econômica e ecológica. A Embrapa desenvolve com
instituições parceiras o projeto em rede Transição Agroecológica, que tem como
objetivo apoiar processos de transição a uma agricultura sustentável, através
da construção participativa do conhecimento agroecológico.
Como exemplos de resultados do
trabalho da Rede, pode ser apresentado o melhoramento genético de bucha vegetal,
com a participação de comunidades da região semiárida do Nordeste. A partir de
critérios definidos pelas próprias comunidades, foram identificados e indicados
os materiais genéticos, com características de fruto de maior interesse para os
agricultores. Da mesma forma, há exemplos de variedades de mandioca indicadas
para produção em sistemas de base ecológica em Pernambuco, indicação de
variedades crioulas de milho mais adaptadas para cultivo ecológico na Paraíba e
em Pernambuco e indicação da cultivar de feijão de alta produtividade para cultivo
em sistemas de base ecológica para a região dos Cerrados.
A agrobiodiversidade, entendida
como a interação entre ambiente, recursos genéticos e sistemas de gestão e
práticas utilizadas pelas populações culturalmente diversas, resultando então
em diferentes formas de uso da terra e água para a produção, também conta com avanços
consideráveis. Como exemplo, podemos citar a incorporação e utilização de
recursos genéticos, insumos básicos para o desenvolvimento de cultivares, raças
animais e microrganismos de grande importância para os setores agroalimentar e
agroindustrial.
Pesquisadores de todo o Brasil
têm realizado extenso e persistente trabalho de coleta, caracterização e
conservação de germoplasmas vegetais, ou seja, material genético, provenientes
da biodiversidade brasileira. Por mais de 30 anos, já foram realizadas centenas
de expedições para coleta, em todas as regiões do Brasil, que resultaram na identificação
e descrição de novas espécies botânicas e no enriquecimento das coleções, que,
além de ajudarem a manter as espécies, servem de base para o seu melhoramento
genético e o seu uso sustentável.
Hoje, a Embrapa possui uma
Plataforma Nacional de Recursos Genéticos com mais de 250.000 acessos de plantas,
animais e microrganismos dando suporte a centenas de programas de melhoramento
genético públicos e privados, desenvolvidos em todo o País. Todo esse acervo genético
pode ser considerado como uma das formas mais simples, limpas e baratas de
proteção do meio ambiente.
Conhecer e usar a
agrobiodiversidade, associada à produção de base ecológica, tem possibilitado o
desenvolvimento de centenas de programas de melhoramento genético, que
representam alguns dos exemplos concretos dos resultados práticos da pesquisa,
desenvolvimento e inovação para a sustentabilidade da agricultura brasileira.
Os números comprovam os
resultados da pesquisa agropecuária. Somente em 2010, a Embrapa e seus parceiros
desenvolveram e disponibilizaram para o mercado 49 novas cultivares, testaram e
indicaram outras 110 cultivares para regiões distintas daquelas para as quais foram
criadas e identificaram e testaram 64 novas estirpes de microrganismos
benéficos para a produção.
Todo esse esforço oferece ao
produtor sementes de variadas espécies mais tolerantes aos diversos ambientes e
climas brasileiros, como o semiárido, por exemplo, onde certas plantações podem
crescer com menor necessidade de água, são desenvolvidas sementes que, a partir
de processos de seleção adequados a sistemas de cultivo de baixo custo,
precisam de menor uso de fertilizantes químicos e defensivos para controle de
pragas. Além disso, pela maior produtividade, geram mais renda.
Todo esse conjunto de pesquisas,
ações e atividades é uma estratégia para manutenção e uso do nosso capital
natural.
Todo o trabalho é feito para
ajudar a manter a oferta de tecnologias, soluções, alternativas e conhecimento
da biodiversidade em patamares compatíveis com o ritmo de crescimento da
agricultura tropical.
Fonte: www.agrosustentavel.com.br
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