PL 219/2014 - Lei que agrava crise hídrica
Em meio a maior crise hídrica da
história de São Paulo, um grupo de deputados busca aprovar na Assembleia
Legislativa projeto de lei que regulariza o desmatamento e diminui as APPs
(Áreas de Preservação Permanente), como as matas ciliares, acentuando a já crítica
situação dos mananciais e bacias hidrográficas do Estado.
O PL 219/2014 dispõe sobre o
Programa de Regularização Ambiental (PRA), o que equivale à regulamentação
paulista para implementação do novo Código Florestal brasileiro (Lei Florestal
12.651/12). O projeto está em regime de urgência e poderá ser votado no dia 9
de dezembro de 2014.
É conhecido que os retrocessos
praticados na Legislação Ambiental brasileira, com a mudança do Código
Florestal, reduziram a proteção de nascentes e APPs de rios e mananciais,
agravando os problemas que levam à escassez de água. Infelizmente, o projeto
agora elaborado por deputados paulistas não só reforça esses pontos, como ainda
reproduz equívocos e confere retrocessos ainda mais nocivos do que os aprovados
na norma federal.
O perigo
Grandes imóveis rurais poderiam fazer a compensação da reserva legal em
outros Estados, exportando as florestas paulistas e ameaçando a conservação da
vegetação.
(Mario Montavani)
Dentre os problemas mais graves
para essa regulamentação de Lei Federal destaca-se o fato de o novo Código
Florestal ser objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade, movida pelo
Ministério Público Federal, em três questões que ainda estão sendo julgadas e
que foram repetidas no projeto de lei paulista.
A regulamentação poderia ser
feita por meio de decreto estadual após discussão com a sociedade nos Conselhos
Estadual de Meio Ambiente e de Recursos Hídricos, envolvendo de forma ampla e
participativa instituições técnicas, comunidade científica, órgãos gestores, produtores
rurais, associações representativas, organizações de defesa do meio ambiente e
interesses difusos, além de cidadãos em geral.
A pretensa regulamentação
paulista do novo Código Florestal brasileiro dá-se por iniciativa do
Legislativo, com um PL protocolado na Assembleia em março, e que foi posto em
votação após nove meses - um verdadeiro recorde de agilidade e tramitação.
O projeto permite que a
recuperação ambiental seja realizada nos biomas fora dos limites territoriais
do Estado de São Paulo. Assim, grandes imóveis rurais poderiam fazer a
compensação da reserva legal em outros Estados, "exportando" as
florestas paulistas e ameaçando a restauração e a conservação da vegetação de
regiões prioritárias para recuperação ambiental, como as localizadas em áreas
de estresse hídrico.
O mais preocupante é a previsão
da diminuição das faixas de recuperação de matas ciliares em APPs, chegando a
pífios cinco metros, desprezando completamente as normas estaduais existentes,
como a resolução de restauração que é reconhecida cientificamente no país.
As bacias hidrográficas do
sistema Cantareira e do Paraíba do Sul, que têm enormes áreas desmatadas (o que
favorece o assoreamento dos reservatórios e rios), seriam ainda mais
prejudicadas. Isso porque o projeto proposto considera pastagens improdutivas e
chácaras de recreio como usos consolidados e, portanto, desobrigados da
recomposição das matas ciliares em metragens e critérios técnicos, como os que
estavam determinados no Código Florestal de 1965 e que resultariam em serviços
ambientais relevantes para a conservação da água.
Diante dessa grave ameaça, é
lamentável a distância dos parlamentares em relação às necessidades da
sociedade, que já tem sofrido com a falta de água. Ao proporem o projeto,
desconsideraram os alertas do clima, da Academia e dos cidadãos. Trabalharam em
prol de interesses de grupos pontuais, ligados a um modelo ultrapassado de
agronegócio, e daqueles que não cumpriram a legislação e, agora, querem dar
continuidade, em São Paulo, à anistia buscada com a aprovação do atual Código
Florestal.
O Estado de São Paulo – que
sempre foi referência em ciência, tecnologia e inovações na área ambiental e,
do que podemos chamar do bom agronegócio – têm promovido a recuperação de APPs
nas margens de rios e mananciais, recuperando microbacias em diversas regiões e
buscando legislações positivas e incentivadoras para os que conservam e buscam
sustentabilidade. Por isso, São Paulo não pode admitir tamanho retrocesso.
Não podemos assistir a mais um
golpe. A sociedade envia um recado aos deputados estaduais: não votem o PL 219,
que diminui a proteção e a recuperação das APPs, essenciais para os mananciais,
rios e nascentes, e agrava a crise da água em São Paulo. Sem floresta não há
água.
Fonte: Mario Mantovani
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